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Vida monástica hoje
Boletim AIM nº 126, 2024
Índice
Editorial
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB, Presidente da AIM
Lectio Divina
“Vai, vende o que tens…” (Mat. 19,21)
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB
Perspectivas
• A vida monástica hoje, respostas ao questionário da AIM
Equipe internacional da AIM
• Alguns elementos de síntese das respostas ao questionário
Equipe internacional da AIM
Notícias
Viagem ao Canadá e aos Estados Unidos
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB
Reflexões
Tentativa para uma visão partilhada
Dom Jeremy Driscoll, OSB
Testemunho
Viver em uma comunidade monástica multicultural
Dom Paul Mark Schwan, OCSO
Arte e Liturgia
A saga da Sala Capitular de Santa Maria de Ovila
Dom Thomas X. Davis, OCSO
Grandes figuras da vida monástica
Irmã Judith Ann Heble, segunda moderadora da CIB
Mother Maire Hickey, OSB
In memoriam
Madre Lazare de Seilhac (1928-2023)
Irmãs beneditinas de Saint Thierry
Editorial
Depois da publicação de “Um espelho da vida monástica hoje” e de “Um sonho monástico”, a equipe internacional da AIM quis lançar uma grande consulta a um certo número de responsáveis monásticos para recolher seus principais pontos de preocupação, suas prioridades, a ajuda que esperam da AIM e alguns exemplos significativos de realizações recentes.
Entre as pessoas consultadas, algumas ficaram surpresas com o questionário da AIM. A Ajuda Inter-Mosteiros é muitas vezes vista como uma simples fonte de financiamento para projetos que recebe de comunidades jovens da África, Ásia, América Latina, Oceania e da Europa e da Europa do Leste. Mas lembremo-nos que a AIM, conforme os Estatutos aprovados pelo Congresso dos Abades Beneditinos em 2004, tem por missão, também refletir sobre o sentido da vida monástica e de sublinhar sua originalidade nas diferentes culturas (artigo 6). A AIM sempre teve a preocupação de favorecer uma tomada de consciência do valor do monaquismo nas comunidades, na Igreja e na sociedade (art.7).
Neste sentido pode-se dizer que a AIM é como um observatório da evolução da vida monástica no mundo, e podia ajudar a ver os questionamentos e principais desafios. Sublinhe-se também que a AIM junto com o DIM-MID (diálogo inter religioso monástico) é o único organismo em que as três Ordens que seguem a Regra de São Bento (tanto homens como mulheres) trabalham juntos. A AIM trabalha também, num laço estreito, com associações monásticas espalhadas pelo mundo: isto lhe permite ter uma compreensão preciosa sobre o que se vive nessas regiões e de ajudar a ver as diferentes maneiras de abordar as realidades da vida monástica hoje.
Por todos estes motivos a AIM está investida, cada vez mais, de uma missão profética, que em vez de fazer concorrência ao papel próprio das Ordens e das Congregações, só quer ajudar, de maneira complementar, a responder melhor ao apelo de Cristo na vida monástica.
Além das respostas ao questionário, este boletim tem também o relato da viagem aos mosteiros da costa Oeste dos Estados Unidos, um testemunho sobre a visão partilhada sobre o modo de governar e sobre o desafio da interculturalidade numa comunidade monástica. Tem também uma rubrica sobre a arte à volta da igreja da abadia de Vina (New Clairvaux, Califórnia) e uma evocação da vida de Ir. Judith-Ann Hebble, que foi a segunda moderadora da Comunhão Internacional das Beneditinas. Acharão também, neste boletim, algumas palavras sobre Ir. Lazare de Seilhac, beneditina de Saint Thierry (França, congregação de Santa Batilde) que tão fielmente contribuiu para a vida da AIM e, sobretudo, para a formação de várias gerações de monges e monjas na interpretação da regra de São Bento. Esperamos publicar mais tarde um artigo mais desenvolvido sobre esta bela figura da vida monástica hoje. Termina este boletim uma recensão de dois livros do P. Denis Huerre (La Pierre-qui-Vire), que retomam os comentários da regra de São Bento, que ele fez à sua comunidade.
Para abrir o boletim, é proposta uma lectio sobre o texto do homem rico nos Evangelhos, que influenciou a vocação de Santo Antão, pai dos monges.
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB
Presidente da AIM
Artigos
“Vai, vende o que tens e dá-o aos pobres,…” (Mat 19,21 e ss)
1
Lectio divina
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB
Presidente da AIM
“Vai, vende o que tens e dá-o aos pobres,
Depois vem, e segue-me”
(Mat 19, 21 e ss)
O dialogo entre Jesus e o jovem do Evangelho, em Mat 19,16-26, nos toca, pois vai ao encontro das nossas aspirações mais profundas. Reconhecemo-nos nesse homem fiel, da religião judaica, e somos profundamente tocados pelas respostas de Jesus, que nos dão uma chave de leitura para viver uma vida de discípulo, uma vida de monge, de monja, semelhante a Ele. Deixemos que este texto nos atinja, deixemo-nos conduzir pelo Espírito, para escutarmos essa palavra, que nos fará caminhar para a frente.
A pergunta do jovem é sobre o que fazer para ter a vida eterna: “Mestre que devo fazer para ter a vida eterna?” (Mat 19, 16)
No primeiro momento Jesus faz referência a alguns mandamentos com base nos deveres religiosos. Mas depois, graças à insistência do seu interlocutor, a resposta é diferente. Olhemos as duas respostas de Jesus, e vejamos como nos situamos considerando a atitude do jovem. 1ª resposta: Jesus cita alguns mandamentos para resumir os deveres religiosos do fiel. Lembra simplesmente os últimos mandamentos do Decálogo e não os cita por ordem como estão na Bíblia (Em Ex. 20 ou em Dt 5) e suprime o último do decálogo, e acrescenta uma prescrição de Lv 19, 18 como uma síntese: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Todos estes mandamentos são sobre o comportamento moral: “não matarás, não cometerás adultério, não roubarás, não darás falso testemunho”. Como o jovem rico, muitos de nós poderíamos responder a Jesus: “Tudo isso eu já faço”. Nossa perspetiva religiosa já fica bem caracterizada com tais disposições éticas, que são, em si já notáveis. Muitos se contentarão com esse tipo de vida louvável.
Mas outros têm a impressão que deve haver uma coisa mais forte na vida humana e que o nosso dever não está somente ligado a um bom comportamento moral, por mais virtuoso que seja.
O jovem insiste: “Que me falta ainda?” É nesta altura que o termo “jovem” aparece no texto. Fazendo esta pergunta crucial, este homem apresenta-se, verdadeiramente, como alguém que quer algo novo. Isso é traduzido com o termo “jovem”, é literalmente um homem “novo”, como um recém nascido. Ele deixa aparecer nele o desejo profundo que o habita. Jesus com sua palavra e seu comportamento favorece que esse desejo emerja; para ele não há nada mais importante na vida: as zonas profundas do nosso ser são chamadas a surgir à luz, e a suscitar uma constante novidade pela ação do Espírito Santo. Eis o que responde Jesus. Dá a conhecer o fundo do seu pensamento: fala de realização e não somente de um dever a cumprir. Esta é a ponta do texto: “Vai, vende tudo o que tens nas mãos (literalmente) dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu, depois vem, e segue-me (anda comigo)”.
Falando assim, Jesus junta a primeira parte do Decálogo, que esquecemos sempre: “Não terás outros deuses, não farás nenhum ídolo, não pronunciarás o nome de Deus sem sentido, observa o dia de sábado”. Trata-se de não se fechar em nenhuma posse demasiado humana. O ídolo é o que se tem na mão, para si, sem deixar a vida livre entre as criaturas de Deus, em toda a liberdade. Assim “vai, vende teus ídolos, reparte o preço que deu com os pobres, mostrando que te despedes de tudo isso e que ficas disponível para adquirir um tesouro no céu”.
A dificuldade, que nós todos temos em responder ao convite que Deus faz, está justamente aqui. Se não largamos, se não renunciamos a todos os ídolos, a tudo o que temos nas mãos, e que é como o motor da nossa vida, até mesmo o ditador dos nossos atos e dos nossos pensamentos, falhamos o encontro essencial a que Deus nos convida e nossa vida instala-se numa perspetiva em que a tristeza tem a última palavra, pois o que os ídolos prometem nunca acontece.
De fato, o jovem ouvindo a palavra de Jesus “foi embora todo triste, pois tinha muitas posses” É interessante notar a palavra usada aqui, que tem um sentido elementar. O jovem considera que o que constitui o seu ter são simples posses; Jesus vê as coisas de outra maneira, fala de outra coisa: trata-se de uma realidade mais fundamental, que habita nossas consciências, e que é o sentido da vida neste mundo, e que merece que se sacrifique tudo.
Mas já escuto protestos. Não é possível! Tanto mais que Jesus insiste:” como é difícil um rico entrar no reino dos Céus; é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, do que um rico entrar no reino dos Céus” – “Para os homens é impossível, mas para Deus tudo é possível”. A comparação usada por Jesus não é para tomar ao pé da letra, é simplesmente para despertar as consciências. Mais do que se agarrar a comportamentos humanos apoiados em representações e posses idolátricas, é mais necessário renunciar a fechar-se sobre si mesmo e sobre o que se pensa ter, como seu, para viver verdadeiramente a liberdade, a alegria e a beleza do mandamento do amor: aí está o único tesouro do Céu. Sim, para as pessoas é impossível, mas para Deus tudo é possível.
Se seguirmos o itinerário do jovem, constatamos que no começo da passagem ele era designado pela palavra “alguém”. “Alguém veio a Jesus”. Este alguém apresenta-se como um autónomo; na expressão “algum” está a palavra “um”. “Um” quer saber o que pode fazer para ter a vida eterna. Jesus lhe responde com “Um” em quem reside o Bom: “Um só é bom”, é na relação com ele que a vida se realiza plenamente, e não em atos perfeitos para responder a deveres religiosos. Quando ele deixa vir à superfície seu desejo profundo, passa a ser chamado de “jovem”. Está para renascer. Este nascer do alto, que sentimos estar próximo, é tocante no jovem. Depois quando se retira, vai cheio de tristeza. A alegria carateriza aquele que decide caminhar com Jesus.
Vejamos o que concretamente este texto nos diz hoje. Nós também queremos a vida. Procuramos o que nos falta, pois viver só de moral religiosa não nos dinamiza. Jesus propõe-nos largar tudo aquilo a que nos agarramos. Jesus diz: “Ninguém pode servir a dois senhores; ou odiará um e amará o outro, ou se apegará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Luc 16, 13)
Mostra como devemos nos deixar a nós mesmos, ou melhor deixar a ilusão que temos de nós, pois muitas vezes estamos apegados a coisas exteriores que fazem de nós personagens, que não são o verdadeiro eu. Deixar-se a si mesmo toca todas as dimensões da nossa vida até nos fazer nascer do alto. É impossível experimentar uma tal dimensão sem largar os ídolos.
Reflitamos sobre o que são hoje os ídolos que nos impedem de ter uma relação livre com Deus e dar testemunho da alegria pascal, que nos tira duma vida parada, porque fechada sobre si mesma.
Sim, há uma alegria imensa em vender tudo para ter um tesouro no céu, e para partilhá-lo, como amor, com todos os pobres de Deus. Por que hesitar, recusar, se é assim que Deus nos promete a realização plena da nossa vida? Este é o testemunho que temos de dar da salvação de Deus. Se Deus nos criou, foi para experimentar a sua vida no coração do itinerário terrestre que temos de fazer: não percamos mais tempo, o Reino de Deus está presente, entremos na alegria que Deus nos dá e mostremo-la a um maior número possível de gente, para que encontrem, desde já, a realização de suas vidas. Esta é a nossa vocação, e é uma felicidade imensa responder a ela.
Respostas ao questionário AIM
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Perspectivas
Equipe internacional da AIM
A vida monástica hoje
Respostas ao questionário da AIM
Eis as respostas recebidas ao questionário sobre a vida monástica hoje, seguidas de uma breve síntese.
Madre Marie-Thérèse, presidente da congregação da Ressurreição
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
Pensamos que uma das nossas principais preocupações é como contribuir para uma melhor compreensão do que é viver juntas na Europa, cuidando umas das outras, ajudando-nos mutuamente, formando juntas certos aspetos da nossa vida, e aprendendo umas das outras. Queremos compreender como a história moldou as comunidades nos países onde estão, o que as anima, o que é que isso exige. Assim alargamos nossos horizontes buscando uma maior unidade.
Quais são suas prioridades? Como lida com isso?
As nossas prioridades são viver o ideal monástico no mundo de hoje e assim dar testemunho da nossa esperança junto de todos. Queremos realizar isso:
- como mulheres de hoje,
- na Igreja de hoje, numa perspetiva sinodal,
- nas nossas comunidades como são hoje: comunidades pequenas,
- no mundo de hoje: é uma nova realidade que evolui rapidamente (no ponto de vista político, social; insegurança crescente – com a guerra na Europa, etc) diante da crise dos migrantes e da crise climática,
- com o apelo à solidariedade.
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
Talvez ajudando certos projetos, igualmente na formação (por exemplo: sabemos que há uma boa formação de leadership em Roma, mas é mais uma formação de responsáveis de empresas). Para nós, precisamos de ajuda para as superioras das nossas comunidades: é diferente do contexto da África, Ásia etc: as superioras têm de lidar com pequenas comunidades, às vezes com muitas irmãs idosas, e à procura de novos recursos. Algumas falaram da necessidade de encontros de formação para a vida monástica, de estudos teológicos, mas também de competências profissionais (para organizar esses encontros de formação, ou acompanhá-los). Algumas falam da necessidade de formação para a comunicação, para construir as comunidades num outro contexto diferente do passado, para construir relações fraternas etc. A AIM poderia talvez também organizar uma plataforma de partilha sobre o acolhimento dos migrantes nas nossas hospedarias.
Neste mundo em que os migrantes não são bem vindos, o novo sentido do A da palavra AIM (Aliança e não mais Ajuda, mesmo se a ajuda faz parte dos objetivos da AIM) tem uma nova atualidade: uma das missões da AIM poderia ser criar pontes entre as comunidades do Norte e do Sul… Seria bom organizar trocas entre comunidades? Nós começamos a sentir como é bom que certas irmãs das nossas comunidades passem alguns meses, ou mesmo um ou dois anos, numa outra comunidade da Congregação. Seria bom organizar tais trocas entre comunidades extra europeias? Vê-se, por exemplo, muitos Filipinos nos nossos países, como trabalhadores, não seria bom que encontrassem Filipinos nas nossas comunidades?
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
Fizemos a experiência de como a fase de conhecimento e de contato umas com as outras nos conectou, e como foi frutuoso para construir a nossa Congregação escrever juntas as nossas Constituições. São o mais amplas possíveis para respeitarem a especificidade de cada comunidade. Sentimos verdadeiramente que a criatividade vem da nossa diversidade. Querer chegar à uniformidade teria destruído a vida.
Madre Maoro Sye, prioresa geral das Irmãs Beneditinas de Tutzing
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
- A mudança do centro de vitalidade da nossa Congregação da Europa/América do Norte para a Asia e Africa: precisa ajuda, há que construir pontes entre as missionárias internacionais e as dirigentes locais.
- Preocupamo-nos que haja uma boa formação para as formadoras, as ecónomas e as responsáveis.
- Há comunidades que envelhecem na Europa, na América e, ao mesmo tempo está começando na Ásia, e ao mesmo tempo há comunidades muito jovens na África.
- Faltam pessoas coluna, referência.
Quais são suas prioridades? Como lida com isso?
- A interculturalidade no contexto tão diversificado da Congregação,
- viver como beneditinas e como missionárias,
- a renovação do nosso carisma numa perspetiva de unidade da Congregação: encorajar a partilha inter-priorados, a partilha de pessoas-referência entre nossos próprios priorados e as realidades de um outra país, mesmo entre jovens professas.
- Os encontros locais e os encontros internacionais (encontros de prioresas, semanas internacionais de encontro, encontro internacional de ecónomas, encontro internacional de formadoras, programa internacional de junioristas, programa de renovação missionária no nosso primeiro país de missão).
- Ateliers de aprofundamento durante as visitas canónicas.
- Ajudar as comunidades frágeis nas diferentes regiões visitadas pelos membros da Casa Generalícia
- Visitas frequentes às comunidades pelos membros da Casa Generalícia e acompanhamento on line.
- Fazer o esforço de enviar regularmente missionárias a longo ou curto termo.
- Partilhar ajudas espirituais (por ex: conferência mensal).
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
- Continuar a publicar material para a formação e a vida comunitária.
- Continuar a financiar as reuniões regionais (BEAO, Cimbra, seminário RB em Tagaytay – Filipinas).
- Ajudar no custo dos estudos das irmãs jovens para que se possam tornar, no futuro, pessoas de referência.
- Ajudar a pagar os encontros internacionais de formação contínua.
Que experiência significativa recente pode partilhar conosco?
- O programa internacional para as jovens professas em Roma (as irmãs jovens de diferentes priorados foram convidadas a participar num programa de um ano, durante o qual viveram, trabalharam, rezaram e estudaram juntas, em vista de uma formação intercultural).
- O encontro de prioresas, o encontro das formadoras e os ateliers de visita canónica em modo sinodal: um encontro espiritual nos reuniu, unidas na diversidade, fazendo a experiência do Espírito Santo.
Irmã Asha Thayyil, presidente da Congregação de Santa Lioba (India)
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
Nós, irmãs beneditinas de Santa Lioba, formamos uma congregação de mulheres consagradas, enraizadas em Cristo e comprometidas com o bem estar da humanidade, em particular com os pobres, os oprimidos e os marginalizados da sociedade.
As maiores preocupações da nossa congregação são como utilizar, o melhor possível, nossas capacidades e como nos equipar para enfrentar os diversos desafios da nossa missão. O futuro da nossa Congregação depende da sinodalidade que inclui, em primeiro lugar, todos os membros, nossos colaboradores, e depois se dirige aos membros da sociedade. Devemos estar prontas para ler e compreender os sinais dos tempos e fazer as mudanças necessárias, com coragem, na nossa vida pessoal, comunitária e apostólica.
Com verdadeiro espírito de sinodalidade temos de pôr de lado nossos preconceitos, nossas preferências e nossos interesses pessoais, e se não der certo, caminhar juntas procurando a unidade na diversidade. Imitando São Bento, “escutemos” a voz de Deus e planejemos um programa, não a curto prazo, mas a longo prazo, para que haja continuidade e eficácia no que planejamos e fazemos.
Quais são suas prioridades? Como lida com elas?
Penso que nossas prioridades são as seguintes:
- Praticar a contemplação diariamente, a partir do apelo à vida consagrada, concentrando-nos nos diversos apostolados.
- Melhorar os conhecimentos e as competências, graças a leituras de livros e a descobertas de pessoas e de lugares.
- Dar a máxima atenção ao desenvolvimento dos recursos humanos dos membros das comunidades, através de diferentes programas de formação no seio da Congregação e fora.
- Criar centro de ensino, centros de trabalho social formando as jovens para serem lideres com visão ética e com sensibilidade social.
- Dar às que trabalham no mundo da saúde e do apostolado social uma formação atualizada. Formar mais membros para este ministério.
- Estabelecer colaboração com outros grupos nos diversos ministérios, no respeito mútuo e no respeito pelos associados.
- Utilizar os melhores recursos humanos em função da capacidade e da qualificação de cada uma.
- Dar às irmãs a melhor educação possível e desenvolver seus conhecimentos, suas competências, numa atitude positiva.
- Como investimos o máximo de recursos na educação, temos de nos concentrar, ao máximo, numa educação de qualidade e na construção dos estudantes que nos são confiados. Nossa prioridade deve ser dada à construção do país, sem se fixar só no ganho económico.
- Tudo o que formulamos deve ser para o melhor de cada membro da Congregação e do apostolado.
- Na fase inicial nos concentraremos na aquisição de conhecimentos de primeira mão sobre a vida e a missão nas nossas comunidades, sobre as relações interpessoais entre os membros e sobre a preparação de um sistema de apoio para criar melhores laços entre os membros.
- Para que o funcionamento da instituição seja eficaz, os diretores e diretrizes de cada estabelecimento devem ter tempo suficiente para criar verdadeiras relações com a população local. A estabilidade dos membros na comunidade é um fator determinante para fortalecer a instituição. Devemos fazer o mínimo de transferências. No entanto, será obrigatório um sistema de avaliação regular sobre a transparência e a participação de todos os membros. As instituições educativas, sociais e médicas deveriam ser precursoras em todos os domínios.
- É importante evitar convidar editores para fazerem publicidade sobre nossos estabelecimentos em matéria de visitas e de lugares para morar. Cada vez que tivermos de assistir a uma reunião, ou a um seminário, longe, é importante pagar os gastos às instituições respetivas e assim defender nossa dignidade e nossa honra.
- Nossas casas e instituições religiosas devem ser centros de dialogo e de partilha. Portanto devem ser lugares em que as pessoas, que buscam conselhos e apoio, possam encontrar as irmãs. Nossas infraestruturas devem estar a serviço da qualidade humana.
- É urgente estudar o direito canónico e civil de cada uma de nossas instituições. Por exemplo: as sociedades devem estar registradas nos diversos Estados, a contabilidade deve ser bem feita, os contratos com uma diocese, ou outra congregação devem ser claros, e deve-se saber gerir conflitos de propriedade etc.
- O Capítulo é órgão de decisão, e o Conselho órgão de execução. Por isso as conselheiras devem ter uma maior capacidade executiva. Que elaborem um plano de ação por um ano, em formato bem definido, e um orçamento aprovado para cada apostolado, e que as irmãs deverão assumir.
- Há uma equipe dirigida por uma conselheira para cada ministério, para o bom funcionamento e eficácia do apostolado
- Propusemos uma avaliação anual dos serviços de todas as nossas instituições. Também uma avaliação anual, livre e franca sobre o trabalho da prioresa e da equipe das responsáveis para avaliar o desempenho dos membros da Congregação. É necessária uma crítica construtiva para crescer.
- A avaliação deve ser feita com bom espírito e baseada sobre a visão, os objetivos e o que está sendo feito. Não deveria haver, jamais, lugar para críticas negativas e fofocas. Este processo permitirá às irmãs analisar a situação, reencontrar coragem e confiança para dar sua contribuição por meio de sugestões, opiniões e confrontos.
- Não é nossa prioridade atual aumentar os campos de missão. O nosso objetivo e reforçar o que já existe.
- Não devemos nos deixar animar pela ilusão de começar missões no estrangeiro, com a preocupação de auto financiamento. Se os recursos humanos forem usados corretamente e colocados a favor de nossas próprias instituições, os salários serão suficientes para cobrir nossas necessidades. Isto melhorará a qualidade dos serviços e a imagem positiva das nossas instituições.
- Nossas irmãs mais velhas são um grande trunfo para a Congregação. É bom utilizar seu saber e sua experiência para enriquecer a geração jovem da Congregação. As novas crescerão com a intuição original da Congregação, informando-se mutuamente.
- Os conflitos e as diferenças são inevitáveis na vida comunitária e no apostolado. Estes problemas devem ser resolvidos entre os membros da comunidade, em vez de pedir à equipe de governo que os resolva. Seria sadio formar uma equipe que tenha competências inatas e adquiridas para resolver tais situações e as queixas, que podem acontecer a qualquer momento.
Como é que a AIM pode dar uma ajuda prática?
Eis, a título de exemplo, duas necessidades urgentes, por ordem de prioridade:
- Uma bolsa de estudo para duas monjas poderem participar da formação contínua em Roma.
- Uma casa (de descanso) para as irmãs num região afastada.
Por favor, faça o que puder. Sua resposta significa muito mais do que pode imaginar, para as nossas famílias monásticas na Índia.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
A gratidão e o reconhecimento estão no coração de toda a relação sólida. Acontece o mesmo com nossa relação com a AIM. Somos sempre muito agradecidas pela ajuda importante e benvinda que nos dão, com discernimento, sempre que pedimos alguma coisa. Que Deus abençoe todos os vossos esforços.
Madre Cecília A. Lañas, presidente da Congregação das Irmãs Beneditinas do Rei Eucarístico (Benedictine Sisters of Eucharistic King)
Quais são as preocupações principais de sua Congregação, hoje?
- A formação das irmãs jovens e a formação permanente das irmãs de votos perpétuos,
- O acompanhamento das irmãs doentes e idosas,
- o uso das redes sociais para promover vocações,
- a manutenção dos edifícios.
Quais são suas prioridades? como lida com elas?
Tudo o que apontei antes são prioridades. Para a formação temos feito o melhor que podemos para aproveitar das redes sociais gratuitas e outros seminários e conferências gratuitas, on line. Algumas de nossas jovens fizeram estudos on line, pedimos bolsas para os programas, às vezes recebemos, às vezes não. Para o cuidado e acompanhamento das irmãs doentes, usamos o pouco dinheiro que vem das aposentadorias da Segurança Social, mas é muito pouco. As nossas irmãs que estão no estrangeiro, dão uma subvenção: infelizmente uma das nossas missões teve de fechar (a de Jakobsberg).
Para a promoção das vocações, como acontece com as outras congregações, temos igualmente dificuldades. Tentamos remediar com os meios de comunicação sociais, mas não estamos em condições de continuar com este esforço.
Para a manutenção e conserto dos edifícios, pedimos ajuda a fontes exteriores, pois não podemos contar com nossos recursos. Algumas de nossas irmãs, ainda capazes, são enviadas em missão para paróquias, escolas, dioceses, mas recebem compensações muito fracas. Contamos sempre com a Providência de Deus.
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
A AIM pode ajudar-nos financeiramente sobretudo na formação e também na promoção das vocações. Nossos edifícios precisam de reparações. Para as irmãs doentes e idosas renovamos uma parte do edifício do noviciado para fazer uma enfermaria. Agradecemos igualmente os livros que foram enviados pela AIM e por todas as ajudas recebidas.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
Quando a pandemia do Covid-19 estava no auge, tentamos nos reunir, como comunidade, via redes sociais. Usamos Zoom para ver, avaliar, partilhar nossa vida monástica e nossa missão nas diferentes casas e zonas afetadas. Temos grandes comunidades aqui, nas Filipinas. Temos uma comunidade em Israel, uma na Alemanha (que infelizmente teve de fechar) e igualmente uma casa de formação em Nangahure, na Indonésia. Cada comunidade partilhou experiências, bênçãos e desafios por meio de vídeos. Por meio desta reunião, on line, cada uma sentiu uma necessidade de renovação e de fraternidade. Sentimos igualmente a necessidade de fazer campanha para mais vocações. Foi uma experiência muito enriquecedora e única.
Irmã Jeanne Weber, presidente da Congregação de Santa Gertrudes (USA)
Quais são as preocupações principais de sua Congregação hoje?
Os membros das comunidades são cada vez mais idosos e em menor número. Atraímos muito poucas vocações, e são geralmente mulheres mais velhas. O número de irmãs capazes de dirigir um mosteiro e a Congregação diminui.
Quais são suas prioridades e como lida com isso?
- Encorajar os membros para crescerem continuamente no modo de vida monástica, diante dos desafios que mencionei. Ajudar as prioresas na direção pastoral de suas comunidades monásticas.
- Ajudar as irmãs para fazerem um tratamento e integrarem a dor que vivem por causa de tantas perdas. Em certos casos encorajamos as comunidades a trabalharem com terapeutas de saúde mental.
- Tomamos consciência que é muito duro para as irmãs verem seus mosteiros serem fechados, e os membros transferidos, quando não há outra solução. Isto implica, em muito casos, a dispersão da comunidade e uma separação de várias centenas, ou até milhares de kilómetros para as irmãs. Mais ainda, não temos bastantes mosteiros com jovens para acolher todas as irmãs. Reestruturamos a forma de governo, no plano civil e canónico dessas comunidades monásticas e estamos desenvolvendo estruturas para cuidar desses membros até à morte da última irmã. Isto permite continuar a viver juntas, ou pelo menos próximo do mosteiro de origem.
- Fazer liderança. Como os mosteiros não são mais autónomos, não podemos mais nomear administradoras residenciais a tempo inteiro. Em vez disso uma irmã o fará a tempo parcial, a partir de seu próprio mosteiro, ou então uma irmã receberá a responsabilidade de vários mosteiros. Encorajamos os mosteiros a planejar o futuro, tomando decisões que simplificarão o peso da liderança. Devemos abordar esta questão a nível da Congregação monástica.
Como é que a AIM pode dar uma ajuda prática?
Não recebemos nenhuma resposta.
Que experiência recente, significativa pode partilhar conosco?
Uma de nossas comunidades monásticas pediu recentemente à Presidente e ao Conselho da Congregação que suspendesse o governo monástico regular e nomeasse uma Comissária. Estas irmãs tinham perdido a prioresa por morte súbita em 2020 e não tinham ninguém capaz de ser eleita. Antes e depois desta época, as irmãs corajosamente enfrentaram a situação em que estavam. Trabalharam com um administrador canónico nomeado pela Congregação para venderem os bens restantes, fecharem as atividades apostólicas e tomarem as disposições sobre os cuidados a longo termo. Elas continuam a viver a vida monástica numa parte do mosteiro, e a diocese local que comprou os edifícios e os terrenos, usa o resto para seus escritórios diocesanos e centro de retiros. Admiro muitíssimo estas irmãs, pelo modo como enfrentaram os desafios e as mudanças a que estavam confrontadas.
Irmã Patty Fawkner, presidente emérita da Congregação do Bom Samaritano, da Austrália. (Sisters of Good Samaritan)
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
A nossa Congregação, Irmãs do Bom Samaritano, da Ordem de São Bento, foi a primeira congregação fundada na Austrália, em 1857, pelo primeiro bispo da Austrália, o beneditino inglês John Bede Polding. Atualmente temos comunidades na Austrália, no Japão, nas Filipinas e em Kiribati. As nossas irmãs jovens vêm das Filipinas e sobretudo de Kiribati. As irmãs australianas envelhecem e diminuem em número. A direção da Congregação no futuro é um grande desafio para nós.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
- Como permanecer concentradas na missão quando os recursos humanos diminuem. É um dos temas centrais do Capítulo deste ano. Examinamos atualmente os sinais dos tempos no nosso mundo e como poderemos responder de modo realista, levando em conta nossos recursos.
- O problema da liderança e do governo. Empregamos pessoal leigo qualificado e dedicado para partilhar a maior parte das responsabilidades da administração prática. Sempre nos engajamos na formação permanente.
Como a AIM pode ajudar concretamente?
É sempre útil fazer parte de uma rede, quando partilhamos os mesmos problemas, por exemplo como ficar concentrado na missão, tendo em conta os limites de nossas experiências humanas e financeiras.
Que experiência significativa recente pode partilhar conosco?
Temos uma longa tradição de educação desde o pré-escolar até ao superior. Temos igualmente uma longa tradição de direção e acompanhamento espiritual. Sempre tivemos como prioridade a mulher. À medida que nossas irmãs envelhecem, a maioria de nós não pode mais engajar-se como professora. Desenvolvemos um programa de estudos e de aconselhamento do Bom Samaritano com o qual damos uma contribuição financeira às mulheres leigas, adultas, que desejam estudar teologia, ou educação religiosa. O programa tem igualmente uma componente de direção espiritual e aconselhamento. Nosso programa funciona desde há três anos e tem sido frutuoso. Contactamos congregações religiosas masculinas para termos uma contribuição financeira para este programa e a resposta foi muito generosa.
Dom Jeremias Schroeder, presidente da Congregação de Sant’Otília
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
- Quatro comunidades frágeis,
- liderança fraca em vários mosteiros,
- um clima de frustração e de cansaço em certas casas europeias,
- o egocentrismo de certas comunidades.
Quais são suas prioridades? Como lida com elas?
- Manter a unidade e a coesão: desenvolver novos meios de comunicação e de dialogo, fazendo da Congregação uma realidade palpável em todas as comunidades.
- Reforçar o sentido da missão: favorecer a nomeação de agentes locais de missão. Privilegiar os projetos que expressam a missão.
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
A AIM pode ajudar-nos lembrando à nossa Congregação que fazemos parte de uma rede cada vez mais vasta: a Confederação e a Família monástica beneditina e cisterciense.
Que experiência recente, significativa pode partilhar conosco?
Gostei de meus encontros com os dois Abades Gerais (Ocso e Or Cist) e com a Moderadora da CIB. Vejo nisso uma oportunidade real de colaboração mundial.
Dom Johannes Perkmann, presidente da Congregação austríaca
Quais são as principais preocupações da sua congregação hoje?
- Colaboração na formação.
- Melhorar o Colégio São Bento.
- Projetos para pôr em prática Laudato Si’.
- Preparação do jubileu da Congregação.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
- Transmitir nossos valores e nossos costumes espirituais à próxima geração.
- Publicações, seminários, acolhimento.
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
Por meio de encontros internacionais.
Que experiência significativa recente pode partilhar conosco?
O processo de pôr em prática de Laudato Si’.
Dom Franziskus Berzdorf, presidente da Congregação de Beuron
Quais são as preocupações principais de sua Congregação hoje?
A maior preocupação é a falta de jovens nos mosteiros. Isto vale tanto para os mosteiros masculinos, como femininos (somos uma congregação mista). Os noviços de todos os mosteiros participam nas semanas de formação organizadas pela associação das irmãs beneditinas da Alemanha. A irmã responsável faz parte de um de nossos mosteiros. A experiência é boa.
A maior parte das comunidades, atualmente, pensa como uma parte de seus edifícios, de que não se precisa mais, poderia ser bem utilizada, com discernimento, para outra coisa. A pergunta principal é a mesma da de uma jovem cristão no mundo: como encontrar uma companheira com quem possa viver bem e partilhar minha visão do mundo, tanto quanto possível?
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
As prioridades de cada mosteiro são, muitas vezes, como gerir a rotina diária; não têm mais força para grandes projetos. Os órgãos da Congregação ajudam os mosteiros que o desejam, ou que o Abade presidente e seu conselho pensa ser necessário e útil. Por exemplo: Os mosteiros devem apresentar certas contas ao Conselho económico da Congregação. Na base da evolução da situação, o Conselho pode chamar a atenção, relativamente rápido, para os perigos económicos.
Como a AIM pode ajudar na prática?
Os mosteiros da Congregação de Beuron não são ricos, segundo as normas europeias, mas têm (a maioria) um orçamento equilibrado. Alguns mosteiros recebem uma ajuda da sua diocese. Para as despesas extraordinárias, como a manutenção dos edifícios tombados, recebem ajuda do Estado.
Há bastantes possibilidades para a formação da próxima geração, assim como para a formação contínua dos monges e monjas. Não vejo, por isso, a necessidade de uma ajuda da AIM na hora atual.
Que experiência significativa recente pode partilhar conosco?
A cooperação entre os mosteiro masculinos e femininos da Congregação tem-se intensificado nestes últimos anos: as monjas participam no Conselho do Abade Presidente e nas Comissões; há co-visitadoras nas visitas canónicas das casas masculinas, etc. Falta ultrapassar alguns obstáculos para se chegar à igualdade. Apesar de várias tentativas da nossa parte, esses obstáculos ainda não foram levantados por Roma.
Dom Alessandro Barban, Prior Geral emérito dos Camaldulenses
Quais são as preocupações principais de sua Congregação hoje?
A preocupação mais importante da nossa Congregação camaldulense é olhar o futuro do cristianismo e o modo como a presença monástica pode permanecer um fermento fecundo na Igreja e no mundo. Receio que o monaquismo perca o sabor do sal, perca a luz do seu carisma e não seja mais significativo nem presente, nem no futuro. E nosso futuro, nos próximos dez anos, anda à volta de três questões: a qualidade das nossas relações fraternas e humanas no seio das comunidades monásticas; a qualidade da nossa lectio divina e da nossa liturgia comunitária; e a qualidade do acolhimento nas nossas hospedarias. Tentamos dar qualidade ao nosso monaquismo, mas este elan exige uma vida espiritual intensa, profunda e cheia de sentido. Não basta observar a Regra, mas redescobrir o sentido beneditino da vida cristã, vivendo-a numa experiência espiritual concreta no seio das nossas comunidades. Talvez tenhamos que fechar certas casas, ou tenhamos menos vocações, mas isso não é o verdadeiro problema. A questão está na realidade evangélica da nossa vida.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
É necessária uma nova proposta sobre a formação. Os jovens de hoje não entendem, e não aceitam mais hierarquias relacionais, nem mentais. E não compreendem a nossa linguagem teológico-espiritual que pertence aos dois últimos séculos. A formação monástica deve ser renovada e, na Igreja, é necessário prever um novo programa de estudos para a teologia. No mosteiro, antes de se preocupar com a transmissão de conteúdos, como se fossem noções a aprender conceitualmente, o importante é, em primeiro lugar, partilhar uma escolha de vida. É portanto necessário apresentar concretamente, desde os primeiros dias do postulado e do noviciado, o estilo de vida monástica. Nossas comunidades são hoje confrontadas com a questão antropológica dos jovens do nosso tempo.
Uma outra coisa é a questão económica e, portanto, a importância do trabalho nas nossas comunidades. Não poderemos continuar a manter o nível de vida burguesa atual.
Como a AIM pode dar uma ajuda concreta?
A AIM deverá contribuir financeiramente para projetos inovadores de formação monástica, tanto na Europa, como noutros Continentes, especialmente os mais pobres. A pobreza de hoje não será necessariamente económica, mas antes de mais cultural. Os monges e as monjas devem receber uma formação humana e teológica adequada, senão não entenderemos o caminho futuro do mundo. A meu ver, a AIM devia concentrar sua ajuda sobretudo na formação. Nossas comunidades começam a ter dificuldade em enviar os jovens para as escolas teológicas do seu país. O preço aumenta ainda mais se forem estudar no estrangeiro.
Que experiência significativa recente pode partilhar conosco?
É difícil responder. As experiências significativas são diferentes. Para nós, as experiências concentram-se todas nos estudos a propor depois do noviciado. Por exemplo: os jovens da Tanzania querem não somente estudar teologia, mas também agricultura, saber plantar plantas e árvores. Na Tanzania começamos a plantar uma floresta de milhares de árvores contra a desertificação, e a proteger e defender as fontes de água. Na Índia, no nosso ashram de Shantivanam a oração típica do ashram acompanha as novas atividades de trabalho, que exigem novas técnicas.
Quero agradecer à AIM por tudo o que faz em favor das comunidades monásticas, que mais precisam de ajuda (não somente económica). A vossa fraternidade e sensibilidade na escuta e no discernimento das ajudas são um grande presente.
Dom Benito Rodriguez Vergara, presidente da Congregação do Cono sul
Quais são as preocupações principais de sua Congregação hoje?
Na nossa Congregação poderia sublinhar alguns aspetos que me parecem importantes, porque tocam todas as comunidades:
- A tensão entre a tradição recebida (identidade) e a novidade.
- A diminuição do número de vocações.
- O envelhecimento dos membros das comunidades e as necessidades de saúde.
- A preocupação dos pais dos monges, das monjas, que envelhecem e exigem que os filhos cuidem deles.
- O exercício da autoridade do Abade.
- A formação contínua.
- O bom uso das redes sociais no mosteiro. O uso e a medida justa da informação, que chega por esses meios.
- O dialogo entre a cultura monástica e a cultura do mundo que se introduziu no mosteiro de diversos modos. Marcar corretamente as “fronteiras” da nossa clausura, igualmente no campo virtual – internet.
- As mudanças climáticas que atingiram certas regiões dos nossos países e afetaram gravemente a economia de algumas de nossas comunidades, por causa da falta de chuva e do aumento da temperatura.
- Um contexto eclesial, político e social complexo.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
Na nossa vida beneditina corremos o risco de cuidar muito das coisas materiais e, por conseguinte, que os membros em formação “funcionem” em tudo o que deve ser feito. Sem negligenciar esse aspeto, penso que é preciso dar prioridade ao fundamento das pessoas e da comunidade sobre a Rocha que é o Cristo, sendo fiéis em tomar o evangelho com o guia. Isto nunca é totalmente conseguido, mas é uma prioridade que deve ser concretizada. Tentamos fazê-lo, ainda que imperfeitamente com as conferências espirituais semanais dos membros da comunidade, com o retiro mensal comunitário, e com as leituras do refeitório, cuidando para ter um certo nível de conversas no recreio. (…) Em resumo, também nos outros aspetos característicos da nossa vida beneditina, que a Regra de São Bento sublinha.
Nos valores que se impõem, hoje, na sociedade, percebemos uma ausência de Deus e, por conseguinte, uma certa decadência nos costumes. A nossa prioridade é, assim, evangelizar o mundo, que vem ao mosteiro por meio dos hóspedes e das pessoas, que conhecemos. Penso que a beleza da nossa vida beneditina é o elemento principal, que podemos dar a esta nova evangelização de que o mundo de hoje precisa. A beleza da vida que tenta simplesmente tomar por guia o Evangelho nas nossas relações com os outros, num quadro de austeridade e de harmonia, como ensina a Regra, e que aqueles que nos visitam apreciam e valorizam muito.
As pessoas que desejam entrar na vida monástica trazem suas circunstâncias próprias de vida e precisam de uma capacidade de acolhimento e de acompanhamento que muitas vezes não estamos à altura de oferecer. Precisa ajudar quem chega a fazer um caminho de auto conhecimento, de cura, de reconciliação. Ajudar o recém chegado a fazer um caminho filial, quando esta dimensão foi quebrada, ou estragada, é um grande desafio para o formador, pois o próprio formador ainda não fez, ele mesmo, esse caminho. É uma questão de humildade e de fé, antes de mais da parte do formador, mesmo quando está disponível uma ajuda uma ajuda terapêutica por parte de profissionais. Ajudar a discernir a autenticidade da procura de Deus, para além da situação humana precária, é uma grande exigência, hoje, tanto para o formador, como para o formando.
O exercício da liderança segundo o espírito da RB é igualmente um desafio importante nas nossas comunidades. Ver bem claro qual é o papel do abade numa comunidade monástica, qual é sua missão, o que é que o Senhor lhe confia. Quando o abade é protagonista demais, pode manter uma forte coesão na comunidade, o que pode ser um valor, mas as pessoas não se desenvolvem individualmente, não conseguem desenvolver criativa e alegremente o seu dom, o que é negativo para o indivíduo e para a comunidade. E quando o abade desaparece, delegando totalmente as responsabilidades, cada monge desenvolve-se individualmente, mas vive-se uma certa atomização, desintegração, o mosteiro funciona bem materialmente, mas a comunidade sofre. A prioridade é que o abade seja um servidor da comunhão dos irmãos, permitindo ao mesmo tempo que cada um exerça seu dom pondo-o a serviço do conjunto.
Em certas de nossa pequenas comunidades, formadas por 3 monges, põe-se a questão de saber como exercer a liderança, quando nenhum dos membros tem realmente a capacidade. A resposta está talvez que seja necessário uma liderança sinodal mais consensual, mais possível.
Como a AIM pode dar uma ajuda prática?
Ajudar-nos a tomar consciência do modo como a vida monástica é vivida no “resto” do mundo, quer dizer além do quadro geográfico da nossa Congregação no Cono-Sul com suas dificuldades e também seus valores. Creio que a AIM pode ajudar-nos a ser mais solidários com as necessidades de outras comunidades, de outros lugares do mundo, que vivem, talvez, em contextos mais difíceis que os nossos. Penso que a AIM pode ajudar financeiramente tudo o que diz respeito à formação, através de iniciativas de SURCO (encontros, cursos, retiros) na edição da revista Cuadernos Monásticos e na organização e participação dos encontros da EMLA.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
Penso que a experiência mais significativa que vivemos como Congregação, foi o último capítulo geral em Maio 2023. Pôde-se palpar, entre os participantes, um espírito muito forte de comunhão. Realizamos que hoje, como as comunidades são mais pequenas, apreciamos mais ser membros de um corpo, que nos faz sentir que fazemos parte de alguma coisa maior, que nos transcende e que nos sustenta. Na nossa Congregação a comunhão constrói-se na complementaridade da diversidade das comunidades, e percebemos isso igualmente na relação rica e fraterna que vivemos entre monges e monjas. Isso é o mais significativo que vivemos recentemente.
A solidariedade que nossas comunidades mais pequenas e frágeis manifestam diante das necessidades materiais e espirituais dos bairros em que estão inseridas. Isso é tocante e vários exemplos podiam ser evocados aqui.
Outra coisa que poderia mencionar, é a criatividade, a eficácia e os esforços das comunidades para gerirem sua economia em contextos nacionais muito complexos.
Dom Markus Eller, presidente da Congregação Bávara
Quais são as preocupações principais de sua Congregação hoje?
A maior preocupação da nossa Congregação é a falta de jovens. Estamos igualmente preocupados com os efeitos da crise do Coronavirus. As hospedarias e a restauração sofreram. Uma das consequências é a falta de pessoal, assim esses setores, e outros, não podem mais funcionar a tempo inteiro. Outro problema grave é o aumento do preço da energia. Isto nos atinge duramente, com nossos grandes edifícios, cuja manutenção é igualmente cara, por causa da preservação de monumentos históricos.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
Procurar oportunidades para encontrar jovens e permitir-lhes viver conosco um certo tempo, de maneira simples. Talvez a procura de possibilidades para dominar os problemas ecológicos ofereça igualmente oportunidades de entrar em contato com jovens: a agricultura ecológica, energias renováveis, produtos regionais. A regra de São bento propõe certamente um estilo de vida simples e alternativo.
Como a AIM poderia ajudar na prática?
A AIM poderia estabelecer contatos com regiões que vivem problemas, ou desafios semelhantes. Só se encontrarão soluções, certamente, a nível regional, localmente.
Que experiência recente significativa pode partilhar conosco?
Considerar os problemas como desafios, que oferecem igualmente oportunidades, a procura de algo novo e a força de largar, de abrir mão de certas formas.
Dom Giuseppe Casetta, abade geral da Congregação de Santa Maria de Vallombrosa
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
1- Ultrapassar a crise da vocação monástica na nossa Congregação
2- Resolver a instabilidade financeira dos mosteiros
3- Desenvolver a fraternidade monástica.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
Minha primeira preocupação e prioridade é desenvolver a fraternidade monástica os mosteiros e os monges da Congregação, para que os monges possam ajudar outras comunidades que têm falta de vocações, e que estão numa situação económica instável. Minhas visitas frequentes e exortações ajudam os monges a ter um só espírito e um só coração.
Como a AIM pode ajudar na prática?
Se a AIM poder ajudar economicamente as nossas comunidades que são financeiramente instáveis, seria uma grande ajuda.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
A grande entre ajuda fraterna que vivemos na ocasião de doenças graves dos co-irmãos.
Dom Guillermo Arboleda Tamayo, ex-presidente da Congregação de Subiaco-Monte Cassino
Quais são as principais preocupações de sua Congregação hoje?
A necessidade de adaptar a nossa legislação ao momento atual e à realidade das nossas comunidades. A legislação atual responde a uma época de expansão, agora vivemos uma época de redução.
A crise de liderança. É difícil encontrar superiores para as comunidades.
A formação das comunidades “jovens”, quero dizer antes de mais todas as comunidades do Vietname, que têm muitos membros.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
As prioridades são as mesmas que já enumerei. Neste momento estamos revendo a legislação para apresentar a proposta de reforma no próximo capítulo geral
- Enfrentar a crise de liderança. Seja como for, há sempre alguém para assumir as comunidades. Isso exige visitas, confiança humilde tanto em relação aos chamados pelas comunidades para as guiarem, como em relação com as comunidades, para as ajudar.
- Formação: Oferecemos a possibilidade a certos membros das nossas comunidades para aprofundarem a formação, nos mosteiros franceses, ou em Santo Anselmo, para que possam contribuir para a formação em suas comunidades; e encorajamos a que aproveitem das oportunidades de formação teológica que já existem em seus países, ou nos países em que estão situadas as comunidades. Insistimos igualmente sobre uma melhor organização do dia monástico, para que a lectio divina e o estudo sejam prioritários.
Como a AIM pode ajudar concretamente?
Continuando a ajudar os programas de formação por região. Planejar alguma coisa específica para o Vietname seria uma grande ajuda. Continuar, igualmente, a dar bolsas a certos monges.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
Talvez a mais recente: na última visita ao Vietname, em Outubro passado, além de uma dificuldade particular devida à demissão do Visitador, pudemos fazer uma assembleia de todos os superiores dos mosteiros, incluindo as casas dependentes, com os delegados das comunidades. Foi um dia muito significativo com bons resultados, graças à nomeação de um Visitador, depois de um discernimento comum, e sobretudo graças à consciência dos participantes da necessidade de assumirem com mais responsabilidade sua província, sem esperar que resolvamos as coisas de fora. Foi possível estabelecer um programa de trabalho em conjunto no seio da província, e isso foi já um bom começo.
Dom Geoffroy Kemlin, Presidente da Congregação de Solesmes
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
A principal preocupação da nossa Congregação, hoje, é a de ser fiel à sua vocação monástica num mundo com tantas facetas e em rápida transformação. Tentamos viver os nossos valores monásticos de modo que seja um verdadeiro testemunho da nossa fé, do nosso chamado monástico, mas ao mesmo tempo de forma que seja audível na nossa cultura atual. Nas culturas ocidentais, por exemplo, a vida monástica é pouco conhecida, e quando é, os jovens têm a impressão de uma vida de um outro planeta, mesmo sendo católicos. Nossa Congregação tem mosteiros na África, nas Antilhas, deveria ser mais fácil alargar o nosso horizonte para além do mundo ocidental e evitar uma compreensão demasiado ocidentalizada. Uma de nossas outras preocupações é a diminuição do número de monges, em várias comunidades.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
Minhas prioridades andam à volta da unidade das comunidades, que vivam de modo mais sinodal, e da unidade na Congregação, em que podem ser achadas muitas opções diferentes. Tentamos pôr em prática o fato que as diferenças não são uma ameaça, mas enriquecem cada membro da comunidade e da Congregação. Penso também que os superiores deveriam ser melhor formados para um serviço que não é fácil. Há já programas muito interessantes que são propostos.
Como a AIM pode ajudar na prática?
A Aim pode ajudar-nos a manter no espírito, que a civilização ocidental não é a única e que existem outros lugares, no mundo, em que a vida monástica é florescente e responde às aspirações espirituais de muitas pessoas. A AIM é um lugar onde a troca de dons está muito presente. Os mosteiros do mundo emergente têm tanto a oferecer, como lugares cheios de vida, com modos inculturados de viver a vida monástica… A AIM é também um meio possível de ajuda material para as nossas comunidades do mundo em desenvolvimento. A AIM pode criar redes. Isso poderia nos ajudar realizando uma auditoria económica, sustentando um projeto concreto em tal ou tal comunidade: construção de um galinheiro, de uma criação de porcos. Talvez também oferecendo bolsas, em especial para futuros formadores, ou para pôr em prática programas de formação no local. Mas isso já acontece, e gostaria que continuasse.
Que experiência recente, significativa, pode partilhar conosco?
Como sou um novo abade, nunca fui na África. Um monge da nossa comunidade fez uma estadia recente em Séguéya, na Guiné Conakry, e contou à comunidade como a vida monástica aí é alegre, mesmo numa grande pobreza, tanto no país, como na comunidade. É a última fundação da nossa Congregação. O país em que vivem tem falta de infraestruturas, como meios de comunicação (estradas), assistência médica… Mas a pequena comunidade tem um alto nível de vida litúrgica, com a liturgia inspirada por Keur Moussa e têm um grande espírito de fraternidade. A formação não é fácil, sobretudo por causa da falta de infraestruturas, a economia é muito frágil e precisam da ajuda dos mosteiros da nossa Congregação para terminarem a construção do mosteiro definitivo.
Dom Christopher Jamison, Presidente da Congregação beneditina inglesa (English Benedictine Congregation)
Quais são as principais preocupações de sua Congregação, hoje?
Como tantas Congregações no seio da Ordem, da Confederação Beneditina, uma das principais preocupações, na hora atual, é a diminuição do número de vocações, e o envelhecimento de muitas de nossas comunidades. Estes dois fatores trazem uma fragilidade em muitas comunidades de monges e de monjas, o que leva a fazer a pergunta da durabilidade (quanto tempo vamos durar ainda). A isto se acrescentam os desafios económicos atuais, e a necessidade de procurar modos criativos de fonte de rendimento.
Uma outra preocupação, embora tenha um lado positivo, está ligada à natureza do nosso apostolado ao futuro nos mosteiros masculinos, e ao modo como podemos responder melhor às necessidades da Igreja no seu conjunto. Uma outra preocupação, também positiva, é saber como integrar, o melhor possível, os mosteiros femininos recentemente agrupados, e que dão um sentimento de nova vida aos mosteiros de monjas, em particular. Isto traz um desafio, pois devem trabalhar juntas para fazer as novas Constituições, que devem expressar a visão comum da vida monástica.
A Congregação Beneditina Inglesa está num momento de transição apaixonante, renovando seu sentido comum de missão e encontrando novas formas de ser um utensílio dinâmico de evangelização.
Quais são suas prioridades e como lida com elas?
Como já mencionei na pergunta anterior, a prioridade da Congregação é:
1. Reforçar e, se necessário, consolidar nossa presença monástica nos oito países em que estamos presentes, Criar verdadeiras comunidades de fé e de fraternidade.
2. Reencontrar um sentido renovado da missão e uma visão comum da vida monástica que nos permita ser um instrumento de evangelização.
3. Crescer na compreensão da “comunhão”, tanto no seio de cada mosteiro, tanto como Congregação composta de homens e de mulheres de diferentes culturas e línguas. Esta internacionalidade e esta diversidade são um dom que devemos explorar e manter..
4. Olhar com coragem aonde teremos, eventualmente de fechar mosteiros e fazer uma fusão, para que possamos nos tornar mais fortes e mais eficientes para atrair vocações.
5. Pensar uma nova maneira de fazer as visitas canónicas, para que se tornem um momento importante para cada comunidade.
Nosso recente Capítulo Geral foi um momento de graça e de crescimento no caminho para uma maior participação no seio da Congregação. Foram criadas seis comissões para examinar os campos chave de renovação e para continuar e facilitar o diálogo:
. Um período possível de formação partilhada.
. O modo como elegemos o Abade Presidente e como seu Conselho alargado pode refletir a internacionalidade e a diversidade da Congregação.
. Levar a sério a formação contínua dos monges e das monjas, especialmente na formação humana.
. Rever as Constituições das monjas para refletirem a história e as tradições das comunidades recentemente agrupadas.
. Examinar a questão da internacionalidade e como podemos respeitar e usar as diversas culturas que compõem a Congregação Beneditina Inglesa.
. Rever o modo de fazer as visitas canónicas, para serem uma experiência vivificante e renovadora.
Como a AIM pode ajudar na prática?
O boletim é uma fonte rica de artigos que revelam o carisma monástico e como é vivido em numerosas regiões diferentes do mundo. A AIM pode ser uma verdadeira ponte entre os mosteiros em países em desenvolvimento, que exploram novos modos criativos de viver a Regra e os mosteiros estabelecidos na Europa e na América do Norte etc. Seria um diálogo importante de escuta e de aprendizagem mútuas. A AIM tem a missão importante de reunir vozes e experiências diferentes. Poderia talvez pensar num encontro intercontinental de monges para partilharem preocupações comuns e crescerem em comunhão.
Que experiência significativa, recente, pode partilhar conosco?
O modo frutuoso como a pandemia do Coronavirus reforçou os laços no seio da Congregação e foi uma experiência significativa. Os períodos de confinamento prolongados levaram a uma apreciação da vida em comunidade e a um diálogo por meio dos “webinários” (conectados) que alimentaram um sentimento real de engajamento intelectual e fraterno. A pandemia do Covid também levou a um adiamento do nosso Capítulo Geral, o que nos deu uma oportunidade maravilhosa para entrar no processo de preparação e que implicou cada comunidade, e todos os capitulares, O próprio Capítulo Geral foi um momento de verdadeira sinodalidade, uma escuta fraterna, que levou a criar as seis comissões para aprofundar o debate. A experiência desse capítulo geral já nos levou a começar um processo de sonhar com o futuro, e a fazer o desafio de tornar nossos sonhos uma realidade. A imobilidade não é uma opção, nossas preo cupações devem ser o motor para ir para a frente.
Alguns elementos de síntese das respostas ao questionário
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Perspectivas
Equipe internacional da AIM
Alguns elementos de síntese
das respostas ao questionário
Eis alguns pontos importantes a partir das respostas ao questionário da AIM:
As principais preocupações
- O sentido da vida monástica no mundo de hoje: como traduzir e transmitir os valores da vida monástica para as novas gerações?
- Liderança e formação: encontrar as pessoas apropriadas para estes serviços nas comunidades
- A falta de vocações, menos fundações e aumento do número de fechamento de mosteiros.
- Os esforços para enraizar a vida monástica na Palavra de Deus e na tradição monástica e na experiência da partilha humana e espiritual.
- Como sair da dicotomia e até mesmo da divisão entre membros das comunidades, e entre indivíduo e bem comum?
- Refletir seriamente sobre as relações entre o hemisfério Norte e hemisfério Sul no mundo monástico.
- A receção concreta da encíclica Laudato Si e da lógica sinodal querida pelo Papa Francisco.
- Alguns colocam a questão da relação com a família (pais idosos, ou doentes e filho único) no contexto das culturas locais.
- A importância da relação dos mosteiros com a comunidade local e como partilhar a vida com leigos que querem associar-se a uma comunidade monástica.
Prioridades a que AIM pode ajudar
- O exercício da autoridade nas comunidades, com a necessidade de pensar sobre diferentes modos de refletir sobre a questão, tendo em vista como procurar uma compreensão profunda deste serviço.
- A ajuda à formação a todos os níveis:
. Formação para superiores e formadores, integrando os esforços de associações (regionais ou nacionais)
. Formação profissional especialmente no campo de atividades lucrativas.
. Formação para a comunicação.
. Ajuda para encontros internacionais de formação contínua.
. Bolsas de estudo para assegurar uma boa formação de pessoas (que se podem tornar pilares) nas comunidades.
. Utilizar e desenvolver meios concretos de contato on line, partilhando material de formação intelectual e espiritual.
- Ajudar as comunidades frágeis.
- Trabalhar a questão do acompanhamento dos irmãos e irmãs idosos no seio das comunidades.
- Estar atento ao enriquecimento mútuo entre membros de diferentes gerações.
- Reflexão séria sobre o uso dos edifícios em relação com a vida das comunidades: a AIM poderia propor um fórum sobre esta questão.
- Cooperação e trabalho com leigos que partilham responsabilidades no seio do mosteiro.
- Continuar a desenvolver o boletim da AIM e de outras publicações da AIM.
- Trabalho da AIM para favorecer uma tomada de consciência da rede formada pelas comunidades através do mundo; a AIM poderia ser uma ponte entre o Norte e o Sul como entre o Este e o Oeste, favorecendo trocas entre comunidades e ajudando a pensar o acolhimento dos migrantes e dos refugiados nas hospedarias.
- Ajudar as comunidades a serem economicamente autosuficientes.
- Ajudar as comunidades que fecham a refletir sobre essa experiência, e a imaginar possibilidades de futuro, e que futuro para seus membros.
- Favorecer trocas de monjas e monges entre as comunidades por um tempo, ou de modo mais permanente.
- Encorajar a igualdade entre homens e mulheres nas Ordens e Congregações.
Experiências recentes importantes
- Formação de novas congregações para as irmãs, com tudo o que isso significa de desafios e oportunidades.
- Encontros internacionais de jovens professos/professas como aconteceu em Roma, recentemente.
Trabalho em comum de superiores(ras) ou de comunidades segundo o processo de sinodalidade.
Colaboração recente entre os dois Abades Gerais cistercienses, o Abade primaz e a Moderadora da CIB.
Conclusão
Tudo isto não é novo, mas o fato dos responsáveis indicarem importância do papel da AIM diante de todos estes desafios, mostra bem a necessidade de reforçar o trabalho e de propor, dar meios eficazes.
A AIM continuará sempre a financiar todo o tipo de projetos, sobretudo os ligados à formação nos mosteiros, nas congregações, mas terá sempre mais o papel de esclarecer para avançar nas melhores condições possíveis e para responder sempre mais ao apelo de Cristo, que procura operários para o seu Reino. Quem quer que sejamos, se respondermos, ele nos convidará na alegria da fé e do amor para a vinda de um mundo novo.
Viajando pelo Canadá e pelos Estados Unidos
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Notícias
Viajando pelo Canadá e pelos Estados Unidos
Outubro de 2023
Dom Jean-Pierre Longeat, OSB,
Presidente da AIM
Em outubro de 2023, o padre Mark Butlin e eu visitamos vários mosteiros na costa oeste dos Estados Unidos, como já havíamos feito no meio-oeste, perto de Chicago, em 2015.
Quinta-feira, 5 - sexta-feira, 6 de outubro
Saindo de Roissy no meio do dia, em 5 de outubro, e depois de uma escala em Amsterdã, chegamos a Vancouver após um voo de dez horas. Fomos recebidos no aeroporto pelo Pe Joseph, um monge da Abadia de Westminster, a cerca de sessenta quilômetros de distância. Ele é um ex-aluno do curso de língua inglesa para formadores monásticos (MFP). Portanto, ele conhece bem o Pe Mark, e assim esse reencontro foi bem caloroso.
O Pe Mark é um veterano na AIM, tendo servido à organização por quase quarenta anos. Ele está com 91 anos, mas parece 20 anos mais jovem, e ainda está à altura da tarefa de realizar qualquer missão ao redor do mundo. Ele até preparou essa viagem; fez todos os contatos com as comunidades, elaborou o programa e organizou a viagem entre Vancouver e Los Angeles. Eu realmente admiro sua capacidade de viver a vida ao máximo. Descobrimos as belas paisagens dessa região entre o mar e as montanhas, não muito longe da fronteira com os EUA. O mosteiro fica no sopé da montanha. Chegamos à noite e o jantar nos aguardava.
As Laudes são celebradas na igreja às 5h, num edifício que data de meados do século passado. Sendo a comunidade composta por cerca de trinta monges, muitos deles jovens, e vários aspirantes ou postulantes que ainda não vestiram o hábito monástico. Os serviços são realizados inteiramente em inglês, em uma atmosfera muito pacífica e de oração. A missa é celebrada às 6h30 da manhã, e ela acontece na presença dos alunos, que participam ativamente (o mosteiro tem um pequeno colégio com 32 alunos). A celebração é digna e, ao mesmo tempo, muito simples. Os hinos são em inglês, exceto o hino de entrada e o da comunhão que é em gregoriano. O padre presidente fez uma pequena homilia e haviam cerca de vinte fiéis, além dos alunos. Pela manhã, encontramos o grupo de monges em formação. Há cerca de dez deles (postulantes e noviços). Conversamos abertamente com eles sobre a experiência monástica e explicamos o que é a AIM. Acima de tudo, respondemos às suas perguntas, que não deixam de ser pertinentes, e assim falamos sobre as formas externas da vida monástica, mas concordamos que o importante não é a forma externa e sim compartilhar o fato de que uma comunidade vive dando todo o seu significado evangélico ao estilo de vida que leva, evitando absolutizar suas práticas e considerar que elas são as únicas válidas. O importante é que a Palavra de Deus está no centro da vida comunitária, e de modo geral, os monges e monjas que conseguem compartilhar essa Palavra de maneira clara, seja na liturgia, na ressonância da lectio, nos momentos de lectio capitular compartilhada, dão a essa Palavra uma atualidade que permite um ímpeto e um dinamismo muito criativos, seja qual for sua idade ou número de monges/monjas! Dessa forma, a Palavra de Deus não é ouvida apenas no segredo da cela, mas circula entre todos para que possa ser vivida cotidianamente, com aquele elemento do novo que dá à existência um sabor de novidade constante e, acima de tudo, de salvação, de saída do impasse. Essa Palavra pode então tocar os visitantes, os convidados da comunidade, e ser compartilhada com eles de maneira viva e frutífera. A Palavra tem uma dimensão universal que pode tocar todos os corações, inclusive aqueles que não compartilham explicitamente a fé cristã. Após essa maravilhosa reunião, celebramos o Ofício do meio-dia e comemos juntos. O mosteiro tem uma horta, e os produtos que consumimos vêm diretamente dela!
À tarde, o irmão que administra a hospedaria nos levou a um passeio pelo mosteiro, que foi fundado em 1939 e continuou a crescer desde então. Atualmente, ele é bem grande. A igreja, que foi inaugurada em meados da década de 1950, e sendo muito grande tem uma arquitetura de concreto altamente original. Os monges contrataram vários artistas importantes para decorar a igreja, que apresenta imagens impressionantes nas paredes. Há também um potente órgão e mobília recente (incluindo bancos) criada por um ex-monge da comunidade que agora dirige uma pequena empresa de carpintaria.
Às 16h15, nos reunimos longamente com a comunidade para uma apresentação em PowerPoint sobre a AIM. É impressionante ver o quão pouco se sabe sobre essa estrutura entre os membros de nossas comunidades. Estamos mais interessados em adquirir nossa autonomia do que na vasta construção de uma comunhão de comunidades, conforme incentivado pelo Concílio Vaticano II. Não faltaram perguntas após nossa apresentação.
Sábado, 7 de outubro
A parte da manhã foi um pouco mais livre e saímos para uma caminhada nos arredores do mosteiro. O prédio está situado em uma alta colina, de onde é possível ver um grande rio abaixo e as montanhas cobertas de neve ao longe. Tudo isso é harmonioso e nenhum ruído ou perturbação chega ao mosteiro.
Em seguida, dirigimos até a fazenda, onde dois irmãos estão no comando. Lá há cerca de cinquenta vacas e dois bezerros que permanecem no estábulo, um dos quais será abatido em breve para o consumo dos monges e convidados, enquanto o outro será mantido como macho reprodutor. O rebanho é dedicado ao fornecimento de carne e é composto por vacas Charolês, algumas delas, importadas da França quando adultas, só obedecem a ordens dadas em francês! Há também cerca de 150 galinhas que fornecem ovos para o consumo da comunidade. Essa presença animal contribui muito para o equilíbrio da vida na natureza.
À tarde, alguns monges queriam uma continuação de nossa reunião do dia anterior, pois havíamos falado sobre a importância de um relacionamento com a Palavra de Deus como o alicerce de nossas vidas, de modo que pediram um tempo de lectio comunitária sobre o Evangelho do dia seguinte, e doze irmãos vieram para este momento. O Evangelho do dia não é fácil, porque discorre sobre os enviados que são maltratados pelos administradores da vinha. Depois de três leituras lentas do texto, deixamos que o que saia de nossos corações viesse à tona. Fico impressionado com o compartilhamento que ocorreu. Realmente chegamos ao âmago do texto e o relacionamos com nossa vocação monástica. Sentimos que é a vitalidade de Deus que nos é dada para recebermos juntos. Como as comunidades cristãs podem não entender que essa é a base de sua alimentação e o meio de sua conversão?
Em seguida, apresentamos um eco do último trabalho da Equipe Internacional da AIM, sobre no questionário enviado aos Presidentes de nossas Ordens e Congregações da Família Beneditina. Com base nas respostas, identificamos uma série de questões que estamos propondo ao grupo. As reações têm sido excelentes, e alguns outros irmãos se juntaram a nós; todos eles jovens, sedentos de significado e vida. Este promete ser um bom ano pela frente.
Depois de visitar os partes do mosteiro pela manhã, o Padre Mark me disse que ficou muito emocionado com a colaboração entre os jovens e os mais velhos. Não há muitos deles, mas eles realmente jogam o jogo e participam do desenvolvimento da comunidade. Está claro que a vida é compartilhada.
As admissões têm aumentado desde 2004, e por que isso acontece? É difícil dizer. Nada foi feito nesse sentido, não houve publicidade, nenhuma pastoral vocacional ou algo do gênero. A escola dirigida pelos monges faz com que alguns alunos queiram se juntar à comunidade e alguns alunos vêm de longe, até mesmo da América Latina.
Depois das Vésperas, seguidas de do jantar e das Vigílias, nos despedimos da comunidade, pois na manhã do dia seguinte, depois do café da manhã, partiremos para a Eucaristia dominical na Abadia de Saint Martin, em Lacey, a quase 400 km de distância. O irmão Joseph nos levará até lá.
Domingo, 8 de outubro
Depois do café da manhã, não nos demoramos muito para sairmos. Atravessar a fronteira com os Estados Unidos leva tempo, e ainda temos que mostrar nossas credenciais nos escritórios de segurança.
Chegamos ao mosteiro por volta das 10h30, e fomos recebidos pelo irmão hospedeiro, que imediatamente nos levou à sacristia para nos prepararmos para a missa, que seria celebrada às 11h. Há cerca de vinte monges de idades variadas na comunidade. A igreja de madeira está lotada de fiéis, que ficam em um semicírculo atrás dos monges. A liturgia é celebrada em inglês, com peças originais de um compositor local. O organista conduz o coro com grande vigor. O monge que preside a Eucaristia fez a homilia um pouco provocativo ao começar a homilia como um conto de fadas: “Era uma vez...”. Essa é uma oportunidade para ele demonstrar até que ponto o fechamento institucional pode ser uma armadilha. A parábola dos vinhateiros homicidas que foi lida diz respeito não apenas aos judeus, mas também a nós mesmos, e devemos permanecer vigilantes quando se trata da não posse dos bens que passam por nossas mãos.
Depois da missa e de nos instalarmos tivemos a refeição no estilo self-service. Saindo do refeitório, o irmão hospedeiro nos levou para um passeio pelo terreno. Onde vimos que a propriedade se estende por muitos hectares e, nos arredores do mosteiro, há um enorme campus com cerca de 1.500 alunos. Esses alunos estão espalhados por vários locais, onde estudam desde os clássicos até as profissões da área de saúde, sem esquecer a ciência, a tecnologia e a música... Alguns monges estão envolvidos, mas são principalmente os leigos que trabalham com a escola. Nesse passeio, demos uma olhada nos prédios que foram construídos durante um longo período de tempo.
As vésperas são às 17h, e como na missa, os irmãos cantam composições muito complexas em várias vozes e podemos sentir que isso faz parte da tradição local e que eles a abraçaram totalmente. Logo após as vésperas, a refeição, feita em self-service como no almoço, seguida de um momento de recreação. Conversei longamente com o antigo abade, cuja família, por parte de mãe, tem origem francesa. Ele não fala nem entende muito do idioma, mas sabe como descrever o jeito francês de ser, e brincamos com isso. Ele também fala sobre a história do mosteiro, que foi fundado no final do século XIX, quando um monge foi enviado da Abadia de Collegeville para a colônia alemã local. Logo foi fundada uma escola ao redor da paróquia e outros monges foram enviados para essa nova missão. Desde então, o trabalho continuou a florescer. Está claro que a vocação desses monges está intimamente ligada à educação.
Segunda-feira, 9 de outubro
Ofício de Laudes às 6h30: os salmos são alternados em estrofes, dois coros. Apenas o hino é cantado durante todo o serviço.
Pela manhã, visitamos a bela biblioteca da Universidade. O Ofício do meio-dia é imediatamente seguido pelo almoço, que é servido no restaurante da universidade, em uma sala especial reservada para os monges. A refeição é acompanhada por um audiolivro.
Antes das Vésperas, reunimo-nos com a comunidade, infelizmente sem o Abade, pois ele está em Roma. Ele está no cargo há apenas um ano e meio, sendo de origem vietnamita, mas vive nos Estados Unidos há muito tempo. Existe um intercâmbio de irmãos muito rico, e todos ficaram surpresos com o fato de a AIM não ser apenas uma distribuidora de dinheiro para projetos de mosteiros, mas também um observatório da vida monástica no mundo e uma fonte de apoio para desenvolvimentos. Decidimos nos reunir após as Vésperas para continuar o debate começado no jantar. A discussão informal refletiu o estado de espírito da comunidade, cuja vocação é inquestionavelmente educacional, mas que agora a vive como uma presença aberta, com menos envolvimento direto nas atividades do colégio (mesmo que ainda haja algum). Esses irmãos estão cientes das iniciativas da AIM há muito tempo, por meio do Secretariado da AIM nos EUA. Eles fazem regularmente uma boa contribuição financeira. Mas precisamos ir além. Estamos passando por um período de mudanças radicais e as questões essenciais precisam ser abordadas com clareza em um compartilhamento comum.
Terça-feira, 10 de outubro
Depois das Laudes e do café da manhã, nos preparamos para partir, e antes de decolarmos para Sacramento, o Padre Justin nos levou até as Irmãs Beneditinas da Congregação de São Bento, que administram um priorado (St. Placid Priory) e um centro espiritual a poucos quilômetros da Abadia de Saint Martin.
Foi uma reunião maravilhosa, que durou cerca de uma hora, com cerca de dez irmãs que compõem essa comunidade e possuem muito dinamismo. Elas nos receberam com grande interesse e compartilhamos com elas sobre o presente e o futuro do monaquismo no mundo. Nós nos despedimos com abraços calorosos que deram o tom de toda a nossa conversa.
O carro seguiu para o aeroporto de Seattle, a cerca de uma hora de distância, e de lá, voamos para Sacramento, onde fomos recebidos pelo Abade Paul-Mark, da Abadia de New Clairvaux, e ficamos hospedados por alguns dias. São duas horas de carro até lá.
Quando chegamos, por volta das 18h, perdemos as vésperas e fomos rapidamente levados ao refeitório para comer alguma coisa. Depois de uma breve conversa no escritório do Abade, fomos para a Sala Capitular, e fomos rapidamente apresentados à comunidade. Durante nossa estada, houve pelo menos duas reuniões com a comunidade, e vários irmãos que nos mostraram diferentes aspectos do mosteiro.
O Ofício de Completas é cantado no escuro. Ele termina, como deveria, com um hino à Virgem. Tudo nesse lugar é cheio de beleza. Os edifícios cobrem uma área muito grande e estão todos em um único nível. Há galerias ao ar livre cobertas por uma estrutura simples que as une. É como um grande jardim cercado por vários edifícios.
Quarta-feira, 11 de outubro
Vigílias às 3h30 da manhã, e a comunidade inteira está lá! O leitor tem uma voz grave; ele articula bem e eu realmente entendo tudo; no entanto, ele tem um sotaque forte. É uma alegria ouvir sua voz no meio da noite.
O Ofício Divino é seguido por meia hora de silêncio. Aprecio essa suspensão do tempo compartilhado em comunidade em que a qualidade do silêncio é intensa.
Café da manhã e tempo livre, seguido de Laudes e Missa às 6h30. Em seguida, o abade nos levou para um passeio pela igreja, que por si só é uma verdadeira curiosidade e para a qual se viajaria muito para ver. Parte da igreja é, na verdade, uma sala capitular medieval importada da Espanha. Foi uma longa história, e a construção não foi concluída até a década de 1980. A sala capitular não foi apenas reconstruída, mas o arquiteto acrescentou uma seção moderna, abrindo uma vista para a natureza com janelas em arco, cada uma delas encimada por um olho de boi estilizado. Os móveis foram projetados com esse espírito de combinar modernidade e tradição, e o resultado é muito feliz. Há também um órgão que veio de uma comunidade religiosa próxima que queria se livrar dele, uma bela capela adjacente do Santíssimo Sacramento e um corredor de entrada que apresenta todo o conjunto. Dedicamos um artigo a ele nesta edição do Boletim da AIM.
Após o Ofício de Terça, o Abade nos confia ao Padre Thomas, o antigo abade do mosteiro, que em breve estará comemorando seu 90º aniversário. O Padre Thomas, cuja simplicidade e espontaneidade são desarmantes, nos leva a um passeio pela bela biblioteca que ele mesmo administra, onde há cerca de 40.000 volumes. É a maior biblioteca trapista dos Estados Unidos! Os sucessivos superiores desse mosteiro, com sua profunda preocupação com a educação, conseguiram construir uma extensa biblioteca contendo todas as principais referências, tanto em termos de periódicos quanto de livros.
Depois de Nona, o irmão Francis nos conduziu a um passeio de carro pela propriedade. Os terrenos do mosteiro cobrem 600 hectares. Eles cultivam árvores frutíferas, principalmente ameixas e nozes, mas também tomates. Tudo isso é confiado a uma empresa independente, o que libera os monges de qualquer preocupação e permite que eles aproveitem ao máximo a colheita, com uma porcentagem indo para a empresa em questão e o restante, é claro, para a comunidade. Há também um vinhedo com todos os tipos de safras, principalmente da Espanha. Terminamos nossa visita na sala de degustação! Os vinhedos, assim como o restante da propriedade, são tratados organicamente.
Nós nos reunimos com a comunidade após as Vésperas para compartilhar com eles o trabalho da AIM. A comunidade conhece bem a AIM-USA, e o Abade Paul-Mark foi membro da Diretoria. Colocamos esse trabalho muito útil no contexto da atividade geral da AIM Internacional e, em seguida, compartilhamos o resumo das respostas ao questionário da AIM. No dia seguinte tivemos outra sessão de trabalho com a comunidade para reunir seus comentários e perguntas.
Há muitos irmãos estrangeiros ou de ascendência estrangeira na comunidade, especialmente da Ásia. É claro que essa é uma característica dos Estados Unidos em geral, mas, mesmo assim, a integração continua sendo um fenômeno a ser acompanhado. A comunidade de Nova Clairvaux é uma das mais prósperas dos Estados Unidos, pelo menos entre os trapistas, mas seria interessante saber o quanto ela é criteriosa ao receber candidatos. De qualquer forma, a impressão geral é muito boa e essa comunidade certamente está vivendo muito bem.
Quinta-feira, 12 de outubro
Pela manhã, passamos algum tempo com o responsável pela adega. Ele é vietnamita, e está nos Estados Unidos há muito tempo. Ele nos mostrou as adegas, que ocupam vários cômodos, e nos apresentou a um colombiano que tem sido o faz-tudo da adega nos últimos oito anos. Em seguida, conhecemos a parte administrativa da fazenda, principalmente os vinhedos, bem como as várias oficinas onde trabalham muitos funcionários. Os prédios são proporcionais à imensidão da propriedade; são galpões antigos que cobrem uma grande área onde nunca há falta de trabalho. No entanto, a atmosfera é serena e monástica. Não faz muito tempo (apenas algumas décadas atrás), os monges eram responsáveis por todo o trabalho; praticamente não havia funcionários leigos. Atualmente, os monges estão livres de restrições excessivamente técnicas; eles ocupam alguns cargos de responsabilidade na administração de tarefas lucrativas ou dedicam tempo à administração do mosteiro e à recepção de hóspedes na hospedaria.
À tarde, tivemos uma longa reunião com o abade, que nos deu uma descrição mais detalhada de sua comunidade. A internacionalidade que a caracteriza é, no final das contas, uma nota muito californiana. Não há nada de extraordinário nisso, e tem sido assim na comunidade há muito tempo: o fato de haver chineses, vietnamitas, um indonésio e não sei de que outra nacionalidade convivendo com americanos nativos que têm várias ascendências, algumas delas europeias, não é um problema aos olhos dele. Cabe ao tempo fazer seu trabalho e dar testemunho dessa universalidade. Não é essa uma das dimensões do reino de Deus?
A reunião da noite foi muito animada. Não faltaram perguntas, inclusive sobre a colaboração e até mesmo sobre a comunhão compartilhada com os leigos e essa foi a que nos manteve ocupados por mais tempo. O Abade falou da importância do Boletim AIM, que nos ajuda a refletir sobre certos assuntos relativos à evolução da vida monástica. Ficamos felizes em ver essa boa participação, mas é preciso muito mais tempo para aprofundar tudo isso e tirar opiniões concretas para a vida cotidiana de nossas comunidades.
Sexta-feira, 13 de outubro
A manhã é um pouco mais livre antes de nossa partida às 10h30 para o aeroporto de Sacramento. No caminho, paramos para almoçar em um restaurante californiano típico, decorado com tábuas de madeira e alguns chapéus de caubói perdidos.
Há poucas pessoas no aeroporto. O check-in e as verificações de segurança ocorrem sem problemas e aterrissamos em Portland (Oregon) por volta das 16h45min. Tivemos um pouco de dificuldade para encontrar o monge que tinha vindo nos buscar. Seu nome é Jean-Marie Vianney e ele é vietnamita de nascimento. Partimos para Mount Angel e chegamos ao mosteiro por volta das 19h30, onde as Completas já haviam sido cantadas. Fomos imediatamente levados para a hospedaria.
Sábado, 14 de outubro
Vigílias, Laudes e café da manhã, seguidos de missa pela manhã. Foi um começo de dia bastante corrido e depois da missa, o abade nos levou a um passeio pelo mosteiro e seus arredores. O abade foi aleito em 2006 e conseguiu desenvolver uma visão geral muito coerente para seu mosteiro.
A comunidade monástica de Mount Angel pertence à congregação suíço-americana e foi fundada pela Abadia de Engelberg no final do século XIX. Atualmente, possui cerca de quarenta monges, com um número bastante grande de jovens.
Ela faz parte de um cenário eclesial integrado, administrando um seminário diocesano com setenta seminaristas para várias dioceses da região. Vários monges trabalham lá, e o abade nomeia o reitor. O prédio do seminário é bastante interessante, estando localizado ao lado do mosteiro, em perfeita harmonia com a arquitetura geral. Considero muito estimulante a ideia de que os seminaristas possam ser formados em conexão com um mosteiro, pois isso, é um incentivo para colocar a vida de um apóstolo em um profundo alicerce espiritual, tanto pessoal quanto comunitário.
Em seguida, visitamos a biblioteca, que abrange a abadia e o seminário. Ela foi projetada pelo famoso arquiteto finlandês Alvar Aälto e esse foi seu último trabalho, podendo assim, ser considerada seu testamento arquitetônico. Minha visita a esse lugar me deixou sem palavras. Os 300.000 volumes reunidos aqui são colocados como se estivessem em um santuário de estudo intelectual e espiritual. O layout não é apenas prático, mas a beleza das formas e dos espaços é realmente única. É essencialmente uma biblioteca religiosa na qual o silêncio é exigido desde o momento em que você entra. Não consigo conter minha admiração enquanto percorro as estantes.
Em seguida, há outro edifício construído por outro arquiteto cujo orgulho era poder imaginar um trabalho próximo ao de Alvar Aälto. Esse prédio é um instituto monástico onde indivíduos e grupos vêm para aprender sobre a vida monástica e a cultura literária, artística e cinematográfica de ontem e de hoje. Esses eventos são muito populares. Em julho, por exemplo, há um grande festival de música como parte do programa do instituto monástico, havendo até mesmo atividades esportivas.
A hospedaria, também construída nas últimas décadas, é bastante excepcional. Quando a visitamos, encontramos todos os tipos de grupos reunidos em diferentes salas. Tudo é perfeitamente organizado e bonito. Existe também um terraço, e a sala de jantar tem vista para o campo por meio de grandes janelas. Deus sabe como é bela a paisagem ao redor do mosteiro. Há quarenta e cinco quartos aqui e a demanda por hospedagem é muito alta. O fato de haver um seminário em Mount Angel significa que o mosteiro está envolvido em um programa pastoral para acolher imigrantes, em conjunto com todas as dioceses e para apoiar tudo isso, há cerca de oitenta funcionários que trabalham em estreita colaboração com o mosteiro. Além disso, os recursos do mosteiro vêm de sua fazenda intensiva, 700 hectares de floresta, investimentos e doações (para os quais há um escritório especial responsável pelo gerenciamento dessa política). As doações não são apenas espontâneas, elas também são solicitadas, e um monge é o diretor dessa unidade de captação de recursos.
Tivemos um tempo para recuperar o fôlego antes do ofício do meio-dia e do almoço. A liturgia é totalmente em inglês. Os textos usados são os estabelecidos no missal e no antifonário, sendo textos traduzidos e adaptados do latim e musicados por um monge. Do meu ponto de vista, isso é totalmente satisfatório. As melodias gregorianas foram adaptadas aos textos (dentro do possível com o idioma inglês) e a atmosfera da oração não é muito diferente daquela de uma liturgia em que o repertório gregoriano clássico é cantado. Há muita paz e serenidade; é uma oração comunitária em que você pode meditar.
À tarde, nos reunimos com a comunidade para falar sobre a AIM. Todos os irmãos estavam presentes e muitos deles fizeram perguntas interessantes. Dá para sentir que há um desejo de refletir sobre o que está acontecendo no mundo e em nossas comunidades. As mentes estão abertas e livres. A comunidade é bastante homogênea. Há alguns estrangeiros perfeitamente integrados. Imagino que nem tudo seja fácil no dia a dia, mas, de qualquer forma, isso não se nota à primeira vista. Decidimos que aqueles que quiserem devem ter a oportunidade de nos encontrar após a refeição, durante o “recreio”, para continuar o intercâmbio. Fizemos isso, e o debate foi tão rico quanto o da tarde.
As Vigílias de Domingo encerraram a noite.
Domingo, 15 de outubro
Na manhã, as Laudes são às 6h35, assim pudemos desfrutar de algum tempo pessoal antes da missa das 9 horas. A missa é celebrada solenemente com um número bastante grande de fiéis, bem como com todos os seminaristas ajudando a cantar. Tudo é em inglês, mas no estilo gregoriano. É simples, acessível e bem composto. No final do serviço religioso, no entanto, os monges e a multidão cantaram um coral sincero na tradição anglo-saxônica, que contrastou um pouco com a sobriedade do restante da cerimônia.
Após a missa, o Abade apresentou o que foi implementado na comunidade em termos de esclarecimento e visibilidade dos objetivos. Todos sabem com o que estão se comprometendo e o significado que isso tem no coração da comunidade. Esse plano de vida foi elaborado em comum com todos os irmãos, e todos podem se referir a ele como uma linguagem comum e uma mesma perspectiva. Um artigo neste boletim da AIM apresenta essa perspectiva.
Às 11 horas, nos reunimos com os cerca de dez jovens monges que ainda estão em formação para um diálogo livre que dá continuidade à nossa apresentação do dia anterior. Começamos com o documento apresentado pelo Abade. A discussão vai bastante longa e pudemos realmente abordar questões fundamentais sobre o significado de nossas vidas, a qualidade dos relacionamentos, a questão do equilíbrio entre a expressão da pessoa e o bem comum, e assim por diante. Estou impressionado com a diversidade dos jovens monges aqui e com sua capacidade de dizer as coisas com tanta liberdade.
Volto à importância de estarmos enraizados no compartilhamento da Palavra de Deus e dos textos que traduziram sua mensagem na tradição monástica. A conversa continuou por uma boa hora.
Depois do almoço e de um descanso, por volta das 15h30, partimos de carro para um passeio pela propriedade. Os monges possuem um total de 2.000 hectares, incluindo florestas e terras agrícolas. Essa é a extensão do passeio pela propriedade. Dirigimos até a cidade vizinha, que também recebeu o nome de Mount Angel, e fomos até a igreja paroquial, que estava fechada. No caminho de volta, paramos na cervejaria do mosteiro. Os monges produzem uma cerveja chamada Benedictine, que tem sido um grande sucesso na região. Visitamos as instalações onde a cerveja é produzida e tomamos um drinque na
pequena cafeteria ao lado, onde vários clientes estavam sentados em um ambiente alegre.
Retornamos para as Vésperas, seguidas de uma refeição. Como em todos os domingos à noite, essa é uma refeição em que conversamos e temos a oportunidade de tomar um pouco de vinho e outras bebidas. Depois, compartilhamos um momento de recreação com a comunidade e retomamos os temas abordados nas reuniões anteriores. Somente aqueles que quiseram fazê-lo estavam presentes, e puderam compartilhar suas impressões sobre o que foi apresentado.
O ofício de Completas encerra o dia. Na manhã seguinte, às 5h15, partimos para o aeroporto de Portland e voltamos para a Califórnia, ao mosteiro de Nova Camaldoli, onde tivemos experiência realmente muito diferente.
Segunda-feira, 16 de outubro
A viagem foi a mais tranquila possível, primeiro de carro e depois de avião, até Monterey, via São Francisco. Ao chegarmos, fomos recebidos por um postulante camaldulense, cuja casa visitaríamos. Ele havia levado o Padre Prior ao médico e deveria levá-lo de volta depois de nos buscar no avião. Quando pegamos o Padre Ignatius, já era tarde e, como a distância até o mosteiro era grande, decidimos parar em algum lugar para almoçar.
Chegamos ao mosteiro no início da tarde, depois de dirigir por uma estrada sinuosa nas montanhas com vista para a costa. A paisagem é de tirar o fôlego. O mosteiro camaldulense fica no alto de uma colina, e todos os edifícios formam uma pequena vila. Nós nos instalamos e entramos na igreja às 17h para as vésperas e a missa. Há uma dúzia de irmãos e alguns convidados. O prior presidiu o serviço e improvisou uma homilia muito estimulante.
À noite, não havia refeição comunitária, então todos faziam seus próprios preparativos em seus eremitérios. A noite termina assim, com todos se retirando para suas casas até o dia seguinte, para as vigílias às 5h30 da manhã.
Terça-feira, 17 de outubro
Os Camaldolenses são uma ordem monástica de direito pontifício fundada por São Romualdo de Ravena em 1012 em Camaldoli, na Toscana (Itália), sob a Regra de São Bento. Os monges camaldolenses combinam uma vida comunitária de trabalho e oração com eremitismo. Em geral, eles vivem em eremitérios e se reúnem para algumas atividades comuns: certos serviços, refeições, momentos de capítulo, trabalho ou relaxamento. Sua vida de solidão é menos radical do que a dos monges cartuxos, mas tem mais ou menos a mesma inspiração, em um estilo beneditino.
Na manhã, após as Laudes, nos reunimos com a comunidade e procedemos da mesma forma que em outros lugares. Ouvimos atentamente. Havia um verdadeiro senso de interesse e decidimos nos reunir novamente no dia seguinte para uma discussão mais aprofundada.
O Padre Mark tinha acabado de receber uma mensagem do mosteiro de Valyermo, que seria nossa última parada. Eles tiveram duas mortes e não poderão nos receber. Portanto, ficaremos em Nova Camaldoli até a data de nosso retorno à França.
Almoçamos com a comunidade. Paradoxalmente, os irmãos conversam durante essa refeição juntos, exceto às sextas-feiras, quando a refeição é feita em silêncio. À noite, eles preparam sua própria comida em seus eremitérios.
Quarta-feira, 18 de outubro
Nesta manhã, tivemos outra reunião maravilhosa com a comunidade em resposta à nossa apresentação do dia anterior. Foi um momento muito bom. E como ainda estaríamos ali nos próximos dias, decidimos reservar um tempo para reuniões em que os monges da comunidade podem vir ou não.
Quinta-feira, 19 de outubro
Outra reunião pela manhã, em um círculo menor com a comunidade, mas uma reunião fascinante com algumas perguntas muito importantes sobre todos os tipos de assuntos relacionados à vida de nossas comunidades: onde estudar, períodos de treinamento no exterior, questões de interculturalidade, fechamentos, como viver quando se sabe que a comunidade vai fechar, reorientação da inspiração evangélica...
Sexta-feira, 20 de outubro
Nosso último dia inteiro nos EUA. Amanhã estaremos voando de volta para Los Angeles. Pela manhã, o Padre Prior Ignatius sugeriu que fôssemos ao topo da montanha, acima do mosteiro, para termos uma vista de tirar o fôlego. Subimos em um carro, uma espécie de jipe off-road antigo, o qual limpamos um pouco antes de nos sentarmos. Ele era dirigido pelo irmão Carlos, um noviço mexicano que foi nosso anjo da guarda durante toda a nossa estada. No meio do caminho, paramos em um lago que parece ter saído diretamente de uma ficção romântica. Há referências aos antigos nativos dessas regiões, índios que há muito tempo migraram para as cidades, onde se tornaram bem-sucedidos nos negócios, ao mesmo tempo em que tentam manter sua própria identidade. Falamos sobre os animais selvagens que ainda existem nessas montanhas: linces e até leões (pumas). Nosso motorista já se deparou com um bobcat, esse tipo de felino que parece um grande gato selvagem e cuja visão não faz você se sentir muito confortável.
Um pouco mais adiante, Carlos nos mostra uma rocha na qual foram cavados buracos com pedras esculpidas usadas para moer grãos nas cavidades. Essa era uma prática comum dos ameríndios da Califórnia.
Continuamos até o topo das montanhas, onde a vista é realmente de tirar o fôlego. Inspiradora. Abaixo de nós, pudemos ver os eremitérios e os edifícios do mosteiro escondidos entre as árvores! Os monges que vivem aqui desde a década de 1950 desenvolveram toda a área. Eles criaram as estradas de montanha de chão batido e cascalho. Eles projetaram a arquitetura e o layout de seu mosteiro com a ajuda de amigos habilidosos. Aqui, nesse canto totalmente remoto das montanhas californianas, eles ainda levam uma vida monástica que é um equilíbrio entre solidão e compartilhamento comunitário. Seus rostos testemunham a beleza de sua vida, embora, é claro, não devamos idealizá-la.
Hora de voltar para baixo. Nosso motorista fez uma manobra na estrada estreita para iniciar uma inversão de marcha, avançando um pouco na beira da estrada. Mas quando ele estava prestes a dar ré, as rodas traseiras do carro não puderam recuar e se enterraram na areia até ficarem no vazio. O veículo ficou bloqueado e não pudemos dar a partida novamente. O telefone não funciona nesses lugares remotos. Só havia uma solução: descer a pé para buscar ajuda. Estamos a cerca de duas horas de caminhada dos eremitérios. Carlos sai na nossa frente em um ritmo acelerado. Na verdade, ele está correndo o caminho todo. Estou sozinho com o Padre Mark e, como velhos aventureiros experientes em todos os tipos de circunstâncias restritivas, rimos da situação. No entanto, interiormente, não me sinto muito confortável porque o Padre Mark não consegue se imaginar caminhando por muito tempo sem se cansar. Encontro uma bengala para ele ao lado do caminho e seguimos em frente, dando pequenos passos. Fomos ao sabor do vento, não conhecíamos a rota e alguns cruzamentos nos deixaram perplexos.
Depois de um tempo, nos sentimos um pouco perdidos no meio dessa terra de ninguém. Tive medo de que um lince aparecesse de repente do nada! Mantivemos nosso senso de humor e o Padre Mark, mais uma vez, tem minha admiração. Não acho que muitas pessoas da idade dele conseguiriam lidar tão generosamente com uma situação dessas. Por fim, ouvimos carros. Nosso motorista correu tão rápido que nos encontrou em pouco tempo, acompanhado de alguns homens grandes que trabalham no mosteiro e que puderam tirar nosso veículo do local onde está preso. O irmão Carlos totalmente suado e ainda sem fôlego. Sentimos muito por ele. Mas a aventura acabou. Voltamos ao mosteiro em um veículo novo e fomos direto para a missa que acabara de começar.
O dia passa tranquilamente e, à noite, após as vésperas, tivemos um jantar recreativo com toda a comunidade. Uma vez por mês, os irmãos aproveitam esse tempo livre tão apreciado. Essa noite também é uma maneira de nos despedirmos. Há um pouco de vinho da Califórnia e da Nova Zelândia e algumas cervejas de diferentes lugares. Ao final desse tempo, trocamos algumas palavras de agradecimento. O prior nos ofereceu dois livros sobre a história de seu mosteiro e a dos camaldulenses. Houve muita emoção nesses momentos de fraternidade. Em seguida, retornamos aos nossos respectivos eremitérios para a última noite.
Sábado, 21 de outubro
Sábado foi nosso último dia em solo americano. Celebramos a missa pela manhã, às 6h30, com a comunidade e, em seguida, embarcamos em nosso avião para Monterey, de onde para Los Angeles e Paris.
Nos despedimos efusivamente e prometemos voltar, como sempre fazemos nesses casos. São promessas sinceras, mas que nem sempre podem se concretizar... Sabemos disso. Mas, neste momento, acreditamos nelas mais do que nunca!
Aterrissamos em Paris no final da manhã de domingo, dia 22, meia hora antes do previsto. O tempo estava bastante cinzento. A Califórnia tinha ficado para trás e eu já podia me ouvir falando francês! Missão cumprida!
Uma tentativa de visão partilhada
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Relexões
Dom Jeremy Driscoll, OSB
Abade de Mount Angel Abbey (Estados Unidos)
Uma tentativa de visão partilhada
O quadro apresentado tenta resumir visualmente em algumas frases a visão da organização da vida de uma comunidade monástica, onde o modus vivendi está ancorado no lema: “Buscai as coisas do alto”. O versículo de Colossenses (3,1) que evoca toda a passagem que São Paulo desenvolve com base nesta exortação. Colossenses 3,1-17 apresenta uma perspectiva que podemos seguir, enunciada em termos bíblicos com a autoridade dos Livros Sagrados. Ali, alguns versículos podem ser entendidos em relação à conversão monástica: “Fazei morrer em vós aquilo que pertence apenas à terra” (Cl 3,5), e também faz referência a uma lista de virtudes e práticas que a vida comunitária monástica procura desenvolver (Cl 3,12-17).
Esta visão bíblica está dividida em cinco pilares, sendo que cada um deles explica um domínio particular do que pode ser descrito como “o caminho e o percurso monástico que a Abadia do Mount Angel procura viver”. O mosteiro nos estabelece numa forma particular de vida religiosa no seio da Igreja, profundamente enraizada em tradições que nos devem moldar constantemente. Mas há muitos estilos e abordagens para o caminho monástico. Ao longo da sua história, o Mount Angel estabeleceu o seu próprio estilo e tradições no seio da vida monástica, onde as dimensões do nosso rico passado nos guiam no nosso presente e no nosso futuro. Não somos simplesmente obrigados a repetir o passado, mas todas as novas ações e decisões que tomamos para o presente e o futuro devem estar em continuidade inteligente, consciente e ponderada com o passado.
Primeiro pilar: “Destacar o como e o porquê”. O carácter único do caminho monástico só se enraíza profundamente se for proposto em voz alta, regularmente, e se for constantemente abordado através do aprofundamento das fontes monásticas estudadas. Penso que esta é uma das principais responsabilidades do abade.
Podemos agrupar sob este pilar várias formas concretas de viver esta clareza do como e do porquê nas nossas comunidades, pois, se não prestarmos atenção a este pilar, corremos o risco de ser uma comunidade de bon-vivants sem nada de especificamente monástico. As rubricas de cada pilar devem ser fluidas na sua formulação, para que possamos assinalar os elementos à medida que os objetivos são atingidos.
Segundo pilar: “Juntos”, este pilar sublinha o valor e a força do monaquismo cenobítico tal como é expresso na Regra de São Bento, na qual, São Bento legisla e exorta jovens e adultos a práticas que são estimulados e estimulam toda a comunidade. Não somos, em primeiro lugar, indivíduos que vivem juntos no mesmo edifício, mas vamos a Deus como um corpo coletivo, e Deus vem a nós com graças que nos tornam um só corpo: este é o “nos pariter” (todos juntos) do final da santa Regra no capítulo 72.
Este pilar apresenta diferentes formas de viver em conjunto para que o abade e a comunidade possam procurar continuamente formas de reforçar os laços comunitários.
Terceiro pilar: “Presença e orientação do abade”. São Bento dá grande importância ao papel do abade na comunidade. Isto é explicado em pormenor nas RB 2 e 64, mas também ao longo de toda a Regra, tanto para as pequenas como para as grandes questões. A comunidade sente inevitavelmente o impacto de quem Deus, através do discernimento da comunidade, colocou no papel de Pai da Comunidade. Um determinado abade será capaz de fazer o que os seus dons e a sua experiência lhe permitirem, necessariamente com algumas falhas. No que me toca, em Mount Angel, quero desenvolver um programa de ensino para a comunidade sobre como viver o Mistério de Cristo e nos deixarmos moldar pela tradição monástica. Busco encontrar a coragem de desafiar a comunidade a um maior crescimento e, ao mesmo tempo, criar uma certa flexibilidade e alegria, dando o maior exemplo possível. Estou consciente de que a comunidade no seu conjunto tem necessidade da presença do Abade na vida quotidiana, e sei que muitos monges, se não todos, desejam se beneficiar da atenção pessoal do Abade. Reconheço que não posso estar presente para todos como gostaria, e gostaria de receber novos recursos da comunidade para me ajudar a responder melhor a esta necessidade.
Quarto pilar: “Contribuir para a Igreja no mundo”. Este pilar reconhece o modo como a vida monástica, ao longo da história da Igreja teve um impacto particular que pode ser descrito como uma “contribuição monástica”. Mount Angel tem tido o seu próprio impacto na região e, de fato, em todo o país, bem como em várias partes do mundo. Vejo que a comunidade é realmente chamada a continuar esta contribuição, a fim de dar energia e sentido à nossa vida em comum. Sob este pilar estão agrupados os nossos trabalhos, nomeadamente no seminário, na biblioteca e na Hospedaria. Há também vários níveis de envolvimento no trabalho paroquial, que sempre esteve indissociavelmente ligado à vida monástica de Mount Angel ao longo da sua história. Nesse sentido, estamos agora numa nova era em que a Igreja está a olhar para nós mais do que nunca para dar esse contributo monástico particular em termos de hospitalidade, cultura, aprendizagem e num estilo pastoral e teológico diferente.
Quinto pilar: “Progredir neste modo de vida.” A tradição monástica insiste no fato de a nossa vida de fé ser um processo que necessita de atenção e encorajamento contínuos. Nunca há um ponto de chegada em que possamos descansar confortavelmente e dizer que terminamos. É um pilar através do qual o abade e os irmãos se encorajam mutuamente a crescer. Significa estar preparado para fazer as coisas de forma diferente - não apenas ser diferente como tal, mas ter a coragem de fazer as coisas de forma diferente juntos, se as circunstâncias o exigirem. É preciso sabedoria e moderação para encontrar o equilíbrio certo e a retidão. Sob este pilar, um versículo do capítulo 64 da Regra de São Bento pode nos guiar: “Que os fortes desejem mais e que os fracos não desanimem”.
Viver em uma comunidade monástica multicultural
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Testemunho
Dom Paul Mark Schwan, OCSO
Abade de New Clairvaux, Vina (Estados Unidos)
Viver em uma comunidade monástica multicultural
Nosso mosteiro, Nossa Senhora de Nova Clairvaux, em Vina, Califórnia, está localizado na parte norte do estado, e nossa comunidade monástica, geralmente chamada de Vina, reflete a população etnicamente diversa do Estado da Califórnia, onde nenhum grupo étnico ou linguístico constitui a maioria. Somos todos minorias.
Atualmente, nossa comunidade monástica é composta pelos seguintes grupos étnicos: vietnamita, cingapuriano, canadense, filipino, chinês, hispânico e euro-americano. Como vivemos a realidade prática dessa diversidade sempre presente em nossa comunidade?
Como uma comunidade trapista, nosso chamado comum ao batismo e sua expressão vocacional particular em uma escola de caridade sob a regra de nosso pai São Bento. A orientação de nosso abade e o imperativo de se apaixonar pelo lugar, pelos irmãos e pela Regra são fatores unificadores essenciais que formam a cultura monástica particular de Vina. Isso necessariamente transcende as origens étnico-raciais dos dezenove monges de nosso mosteiro. No entanto, a realidade concreta de viver, compreender, aceitar e respeitar uns aos outros, que já é bastante difícil em um ambiente monocultural, é ainda mais posta à prova no ambiente multicultural de Vina.
Antes de prosseguir na articulação de minha experiência de pastorear nossa comunidade monástica multicultural, gostaria de definir cultura e como entendo a vida multicultural. Apresento insights de dois livros úteis: The Bush was Blazing but not Consumed e God is Rice.
O que é cultura?
O conceito não pode se limitar à raça e/ou origem étnica. A cultura abrange toda a experiência de vida. Isso inclui necessariamente um sistema de valores, crenças, percepções, suposições, padrões, costumes e práticas. Parte disso é consciente, mas acredito que a parte inconsciente é muito mais importante. Esse sistema cultural é o que fornece o prisma pelo qual cada um de nós é capaz de interpretar, avaliar e reagir à vida e ao nosso ambiente. A vida é um grande mistério que às vezes pode parecer hostil. Todos os sistemas culturais são tentativas de confortar e abrigar uma pessoa, de reduzir sua ansiedade, explicando as forças que podem minar a família, a comunidade, a sociedade e a nação. Portanto, um sistema cultural é o que ajuda a fornecer um andaime de elementos unificadores que constroem estruturas para manter um corpo coletivo de pessoas em segurança.
Em uma comunidade multicultural como a nossa, a singularidade das culturas representadas no mosteiro não pode ser destruída. Por exemplo, um candidato de fora dos Estados Unidos que se junta a Vina não será transformado em um americano, mesmo que a sociedade mais ampla na qual o mosteiro está localizado tenha um impacto. Não, o candidato vem até nós em resposta a um chamado de Deus para viver o Evangelho como monge. Dessa forma, o candidato entra na cultura monástica como é encontrada em Vina e é formado para ser um monge dentro do carisma do monaquismo trapista.
A identidade do candidato é preservada no desenvolvimento da vida, mas ensinando-o a se envolver em um diálogo construtivo com outras pessoas. O respeito e o apoio de todos os que o cercam são cruciais. Esse é um critério fundamental em qualquer programa de noviciado sólido. O equilíbrio entre a comunicação com o outro e, ao mesmo tempo, o reconhecimento de sua identidade autêntica permite que ambas as partes aprendam uma com a outra, cresçam, mudem (conversio) e adquiram uma identidade, coesão e espírito coletivos (communio). Essa é a transformação evangélica, o próprio propósito da vida monástica.
Quando recebo um candidato de uma cultura diferente daquela da comunidade anfitriã, há duas coisas que considero úteis. Em primeiro lugar, conhecer e entender melhor minha própria cultura. É uma experiência enriquecedora. Em segundo lugar, para conhecer o máximo possível sobre a cultura do candidato anfitrião. Por exemplo, eu li tanto sobre as diferentes histórias e culturas em Vina que posso acabar sabendo mais sobre a cultura do candidato do que ele mesmo. Mas, como já dissemos, a cultura é muito mais do que conhecer os fatos, é todo um modo de vida profundamente enraizado na mente de cada pessoa.
Não é de surpreender que certos aspectos de minha própria cultura sejam muitas vezes inconscientes e só possam vir à tona conscientemente por meio de estudo e reflexão. Isso faz parte do ascetismo monástico, num crescimento de autoconhecimento (humildade). Com uma nova apreciação de minha própria cultura, tenho um vocabulário que torna possível as perguntas que posso fazer ao candidato e, por meio delas, ele pode compartilhar comigo a riqueza de significado de sua cultura na interseção de nossos valores monásticos e os da cultura americana mais ampla da qual ele agora faz parte.
Se o inglês não for a língua materna do candidato, é necessário oferecer cursos de idiomas. Nossa prática é empregar um professor qualificado de inglês como segundo idioma para considerar a entrada no mosteiro. As aulas geralmente ocorrem várias vezes por semana. O curso dura de um a dois anos, dependendo da capacidade do candidato. Tem se mostrado inestimável, se não essencial, que o candidato seja exposto à cultura americana mais ampla em um estágio posterior. Para isso, inscrevemos o candidato em cursos de inglês oferecidos a estudantes estrangeiros na universidade estadual mais próxima. O programa universitário foi criado para preparar esses alunos para o ingresso na universidade. Como parte desse programa, nossos candidatos fazem os exames TOFEL para testar seu domínio do inglês. O exame confirma o nível de inglês de nossos candidatos, pois indica seu grau de compreensão do idioma, portanto, essa oportunidade não se repetirá. Também providenciamos treinadores de idiomas e outros tutores para trabalhar com os candidatos na redução do sotaque ou para melhorar suas habilidades de escrita e leitura. Nós os inscrevemos em programas semelhantes disponíveis na diocese à qual pertencemos.
Ha muito tempo, os mosteiros trapistas dos Estados Unidos oferecem um curso de duas semanas sobre teologia monástica para todos os monges professos simples, realizado em um mosteiro diferente a cada sessão. Isso permite que nossos candidatos aprendam sobre outros mosteiros e conheçam outros jovens em formação na Ordem Trapista aqui nos EUA. Além disso, após os votos solenes, é possível fazer estudos teológicos avançados em várias escolas beneditinas de teologia, se for considerado útil, e isso também é útil na área de inculturação. Outra ferramenta importante aqui em Vina, para criar uma comunidade multicultural são os workshops realizados por profissionais treinados em intercâmbios multiculturais.
Viver com uma diversidade de culturas, mesmo quando unidos sob a bandeira de uma cultura monástica comum, exige uma conversão contínua por parte de todos os monges. Aprender a aceitar o inglês falado em uma variedade de sotaques, segundo o uso comum do inglês no mundo de hoje. Onde o inglês não é falado com sotaque? Todo falante de inglês fala com algum sotaque. Qual é o sotaque correto, o do graduado em Oxford ou o do cara do interior da Austrália, ou qualquer outro sotaque intermediário? No entanto, a necessidade de ser paciente e de desenvolver a prática da escuta atenta quando um texto é lido em uma variedade de sotaques é exigente e, às vezes, se transforma em frustração. Alguns irmãos aqui em Vina se referem à regra de São Bento, dizendo que somente os leitores que são capazes de ajudar seus ouvintes devem ter permissão para ler. O resultado poderia ser que poucos ou nenhum irmão estaria disponível para uma leitura pública aqui em Vina!
Outro desafio é saber como fazer as correções. Cada cultura ao redor do mundo tem sua própria maneira particular de corrigir comportamentos inadequados. São Bento estabelece um método de correção em vários capítulos de sua Regra. Seria difícil implementá-lo na maioria dos casos e em todas as partes do mundo hoje. Mas é essencial que as correções sejam feitas no mosteiro. Algumas culturas lidam com a questão da correção de falhas de forma muito direta, enquanto outras são mais indiretas. É importante que, quando a correção for feita, a pessoa que está sendo corrigida seja respeitada e que o monge que está fazendo a correção seja sensível à dignidade da outra pessoa. Devemos pensar duas vezes antes de corrigir outra pessoa! Há outro aspecto da correção em Vina que, às vezes, é negligenciado: não importa o cuidado com que a correção seja formulada, o irmão que está sendo corrigido pode não entender todas as palavras ou compreender as sutilezas do vocabulário inglês. O resultado pode ser um mal-entendido, ressentimento e raiva. O valor das palavras, em qualquer idioma, envolve uma infinidade de nuances. Para alguém que está aprendendo inglês, essas nuances provavelmente não serão percebidas. Um falante nativo de inglês deve reconhecer que é improvável que a outra pessoa compreenda essas nuances. Daí a necessidade de usar um vocabulário básico. Nesse processo, o falante nativo pode pensar implicitamente que a outra pessoa é menos inteligente, menos instruída e ser condescendente, até mesmo desdenhoso, em relação a ela. A necessidade de paciência por parte do falante nativo de inglês é imprescindível quando o falante de inglês como segundo idioma está tentando expressar experiências internas significativas, embora não tenha o vocabulário diferenciado para isso.
O papel da linguagem corporal nunca pode ser subestimado na comunicação interpessoal. Qual é a distância adequada entre duas pessoas ao se comunicarem? Na cultura americana, cerca de um metro é considerado a distância física confortável entre duas pessoas. Outras culturas esperam que a distância física seja maior ou menor. Em algumas culturas, a pessoa mais jovem segura a mão da pessoa mais velha quando se dirige a ela em um assunto importante. Isso expressa respeito e submissão da pessoa mais jovem. Outra expressão cultural de respeito é o fato de uma pessoa mais jovem andar atrás e ao lado de uma pessoa mais velha, nunca lado a lado como iguais. Em outras culturas, é considerado apropriado simplesmente entrar no escritório do superior sem bater na porta. Mas, em outras culturas, quando se dá permissão para entrar, é adequado dizer “com licença”, antes de entrar.
O lugar que a comida ocupa em nossa comunidade monástica está ligado à linguagem corporal. A comida em si é um tesouro de expressão cultural. O que é preparado, como é preparado, como é servido, quando é servido e como é comido são todos elementos importantes. Temos um irmão encarregado de supervisionar a cozinha. Ele cuida da qualidade, da quantidade e do consumo dos alimentos, mas vários irmãos se revezam para cozinhar. Seguindo os princípios fundamentais do jejum trapista, a abstinência e a simplicidade, o irmão que cozinha durante o dia prepara pratos que lhe são familiares. Para nós, isso significa uma dieta variada, refletindo a cultura de origem dos irmãos e exigindo outro tema a ser considerado que é o fato de que nunca é demais enfatizar a importância de respeitar e honrar as expressões culturais dos outros. Muitos de nossos irmãos vêm da Ásia. Para eles, o Ano Novo Lunar é o evento festivo central em torno do qual gira o ano inteiro. É uma celebração que contém rituais atemporais de lembrança, história e identidade como povo, família e indivíduo. Considerar o Ano Novo Lunar como estranho e sem sentido em nossa comunidade, porque nós, americanos nativos, somos indiferentes a ele, é uma violência à identidade dos outros. Isso é mais do que uma falta de respeito; significa implicitamente que tenho pouco ou nada a aprender com meu irmão. A comunidade multicultural é necessariamente bilateral, e é chamada a viver em intercâmbio. Recebemos, damos e aprendemos uns com os outros, e esperamos que cada um de nós ajuste sua dieta.
Por fim, é importante falar sobre o papel da família e como a hospitalidade é expressa ao receber uma família em uma comunidade multicultural. Nossa prática trapista permanece rigorosa quando se trata de visitas familiares. São nossas famílias que geralmente vêm nos visitar no mosteiro. Como regra geral, não visitamos nossas famílias, embora haja exceções. As famílias de nossos irmãos de países estrangeiros geralmente não conseguem obter vistos nem podem arcar com os custos da viagem, e isso é uma exceção para os irmãos terem permissão ir visitar os familiares. Além disso, há o envolvimento em assuntos familiares relacionados a questões de saúde, doença e finanças. Nosso estilo de vida cisterciense limita o envolvimento nessas questões, mas não é tão fácil educar os irmãos nessa renúncia radical à família e, menos ainda, transmitir esse valor às famílias. Deve-se fazer um discernimento cuidadoso quanto a, se, e como ajudar a família quando problemas surgirem. O monge deve ser treinado no ascetismo monástico com um saudável distanciamento da família. Também é importante que o mosteiro não seja visto como um recurso financeiro.
O coração humano é complexo e o amor é um mistério. Nenhum deles escapa à compreensão, mas também não é facilmente revelado, a menos que aceitemos que Ele nos visite de dentro para fora. Essa jornada interior é, obviamente, um aspecto crucial da vocação monástica, combinada com nosso testemunho monástico multicultural de Vina, e acredito que isso é o que nosso mundo polarizado e temeroso precisa. Essa diversidade em nossa comunidade monástica é um desafio, mas os benefícios são enormes, pois podemos ampliar os horizontes, ver a vida de uma perspectiva diferente, sair da minha própria zona de conforto - essas são apenas algumas das recompensas que recebi por viver em uma comunidade multicultural.
A saga da Sala Capitular de Santa Maria de Ovila
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Arte e liturgia
Dom Thomas X. Davis, OCSO
Abade Emérito da Abadia de New Clairvaux (Estados Unidos)
A saga da Sala capitular
de Santa Maria de Óvila
Foi em junho de 1955, poucos dias antes da partida do primeiro grupo de fundadores destinados à quinta casa-filha de Getsémani para a Califórnia, em Vina, que D. James, o abade, sugeriu que gostaria que eu fizesse parte desse grupo. Isto foi para mim uma surpresa um pouco perturbadora. Respondi que não queria ir, e que realmente não tinha vontade nenhuma de ir. Ingenuamente, pensei que poderia fazer o abade mudar de ideia. Seria preciso tempo. Três meses depois, a 15 de setembro, encontrava-me em São Francisco com um irmão também destinado a essa comunidade recém-fundada. O superior estava lá para nos receber, e ele decidiu que deveríamos ver um pouco da cidade antes de fazer a viagem de seis horas pelo Vale do Sacramento até Vina, naquela noite. Um amigo do superior nos mostrou a cidade de São Francisco, escolhendo os principais pontos turísticos. Enquanto passávamos pelo Golden Gate Park, essa pessoa mencionou casualmente que as caixas de madeira que vimos empilhadas sob os eucaliptos atrás do De Young Museum eram “o mosteiro cisterciense que William Randolph Hearst trouxe de Espanha”. Compreendi imediatamente o valor arquitetônico deste mosteiro. Thomas Merton (Padre Louis, como era conhecido) tinha acabado de dar aos nossos jovens monges um curso sobre a arquitetura cisterciense e o seu significado. Ocorreu-me a ideia, extremamente ambiciosa para um simples professo de vinte anos, de que seria maravilhoso ter este mosteiro em Vina. Olhando para trás, apercebo-me agora que, se tivesse apanhado o comboio com o grupo fundador original, teria chegado à estação de Oroville, uma cidade não muito longe de Vina. Nunca teria aterrado em São Francisco e nunca teria tido a oportunidade de ver aquelas caixas de madeira empilhadas sob os eucaliptos.
Afonso VIII, rei de Castela (1155-1214), fundou a abadia cisterciense de Santa Maria de Ovila, perto de Trillo, a cerca de oitenta quilómetros a nordeste de Madrid. Esta abadia fazia parte da sua estratégia para manter as fronteiras do seu reino como uma terra cristã. A abadia foi fundada por volta de 1181, e as dimensões da igreja e da sala capitular sugerem que a abadia poderia estar destinada a ser um mosteiro real. Poucos anos depois da fundação de Ovila, Leonor, esposa de Afonso VIII e filha de Henrique II e de Eleanor da Aquitânia, iniciou a fundação de Las Huelgas, na cidade real de Burgos. Las Huelgas tornou-se o mosteiro real. A sala capitular, um magnífico exemplo da arquitetura gótica cisterciense primitiva na Espanha, foi iniciada por volta de 1190. A sala capitular, assim como toda a abadia, estava sob o patrocínio do bispo cisterciense de Siguenza, São Martinho de Finojosa, e da sua família, em cuja diocese se encontrava. (No calendário litúrgico cisterciense trapista, a festa de São Martinho de Finojosa é a 17 de setembro. Antigamente era conhecido como São Sacerdos, a 5 de maio). A sala capitular foi concluída em 1220 e é reconhecida, juntamente com Las Huelgas e Santa Maria de Huerta, como exemplos notáveis da arquitetura cisterciense.
A abadia de Ovila foi encerrada em 1835, por decreto do governo da rainha Maria Cristina, e vendida a proprietários privados. Arthur Byne, agente de William Randolph Hearst, que sempre se interessou por peças de arte e arquitetura para exportar para os Estados Unidos, encontrou a Abadia de Ovila em 1930. Hearst aceitou comprar parte da arte e da arquitetura, incluindo toda a sala capitular e o refeitório. O desmantelamento teve lugar entre março e 1 de julho de 1931. As pedras foram transportadas para São Francisco. Nessa altura, Hearst começa a sentir os efeitos da crise econômica e doou-as à cidade de São Francisco em 1941. A cidade guardou as caixas atrás do Young Museum, debaixo dos eucaliptos. Foi assim que as vi em 1955. Várias razões impediram a cidade de restaurar as pedras “como um mosteiro”. As pedras chegaram a ser oferecidas a monges budistas, mas a opinião pública da cidade se opôs à transferência. As caixas permaneceram debaixo dos eucaliptos. Cinco incêndios, vandalismo, roubo e o tempo húmido e nebuloso da Baía e da região oceânica de São Francisco reduziram as pedras a um monte aparentemente sem valor. Durante esses anos infelizes, fui informado por um bom amigo do que estava acontecendo às pedras. Depois de me tornar abade em 1972, decidi perseguir o meu sonho louco de adquirir a sala capitular de Vina. O portal da igreja de Ovila foi restaurado no interior do museu de Young. Um estudo anterior efetuado pela historiadora de arte Dra. Margaret Burke revelou que apenas a sala do capítulo podia ser restaurada; o resto estava demasiado danificado ou perdido. Começaram então negociações intermináveis com a cidade. Houve altos e baixos. Estava prestes a abandonar o meu projeto quando os acadêmicos cistercienses David Bell e Terryl Kinder me encorajaram a continuar. Em 1992, o Capítulo Conventual de Vina votou a favor do projeto. Um acordo com a cidade foi finalmente assinado a 12 de setembro de 1994.
No dia seguinte, o primeiro de onze grandes camiões e reboques partiu para Vina. A triagem, a catalogação, o restauro das partes danificadas, o corte de novas pedras e muito mais foram tarefas dos pedreiros Oskar Kempt, Ross Leuthard, Frank Helmholz e do arquiteto espanhol José Miguel Merino de Cáceres. O magnífico portal da sala capitular e a maior parte do interior foram concluídos no outono de 2008. Sob a direção do quarto abade de Vina, Paul Mark Schwan, foi tomada a decisão de incorporar este edifício na nova igreja, que foi concluída e consagrada a 2 de julho de 2018.
A arquitetura cisterciense utiliza o espaço, as proporções, as linhas, a forma e a luz para significar o mistério da Divindade. Os irmãos entram sete vezes por dia neste lugar de mistério divino para cantar os louvores de Deus (Opus Dei) e serem abençoados pela força transformadora deste edifício medieval. A sala capitular de Ovila está agora, uma vez mais e de forma diferente do que no passado, ao serviço da obra de Deus.
Irmã Judith-Ann Heble
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Grandes figuras da vida monástica
Madre Maire Hickey, OSB
Abadessa de Kylemore (Irlanda)
Irmã Judith-Ann Heble,
Segunda moderador da Comunhão
Beneditinos Internacionais (CIB)[1]
Quando me lembro de Judith Ann, não é em termos da sua função. A conhecia como alguém que dava tudo de si, de corpo e alma, para a tarefa que tinha em mãos. Responder ao desafio, fosse ele qual fosse, era o seu papel. Trabalhei com ela durante nove anos à frente do CIB. De 1997 a 2006, fui Moderadora, com Judith Ann como membra do Conselho de Administração a partir de 1998 e como Vice Moderadora a partir de 2002. Tenho memórias calorosas e vivas de como ela foi uma parceira nesta tarefa, e estou grata a Lynn McKenzie por me ter pedido para partilhar algumas delas com os leitores do newsletter.
A nossa relação começou em 1997, na última reunião preparatória do terceiro simpósio da CIB, agendado para 1998. Eu era o moderadora e a minha assistente era a Prioresa Irene Dabalus, tendo ambas sido nomeadas pelo Abade Primaz Marcel Rooney. Os outros membros do Comité Executivo - a Abadessa Joanna Jamieson e a recém chegada Irmã Judith Ann Heble estavam presentes, assim como a Secretária, Irmã Monica Lewis.
Até então, a nossa experiência de organização de reuniões tinha sido muito limitada, consistindo principalmente na organização de reuniões capitulares, cada uma na sua própria comunidade. A organização era um pouco aleatória. Quando nos sentamos juntas para decidir a divisão de tarefas para as várias sessões do simpósio, Judith Ann anunciou, sem quaisquer perguntas ou dúvidas “Eu trato dos pormenores”. E assim foi feito. A partir de então, em todas as reuniões, a sessão de “porcas e parafusos” de Judith Ann no início de cada dia assegurava absolutamente que todos sabiam o que ia acontecer, onde tinham de ir, para quê, quando seriam os intervalos, etc. Uma das marcas de Judith Ann neste ritual diário era o toque leve das suas intervenções, que deixava toda a gente a sorrir em todas as circunstâncias e ansiosas por um dia interessante.
Foi assim que me senti em relação a Judith Ann no seu papel de moderadora adjunta. Ela trouxe uma energia positiva à reunião, estava plenamente consciente de todos os pormenores que precisavam de ser organizados para que a reunião decorresse da melhor forma possível e se certificou de que todos sabiam o que precisavam de saber. Um aspeto importante da vida, de acordo com a regra de São Bento, é a boa ordem, a paz - ninguém deve estar triste na casa de Deus no final de cada dia.
Depois desse simpósio, a Irmã Judith Ann compreendeu o que era a CIB e para onde estava tentando caminhar. Numa reunião pós-simpósio dos membros da Conferência, para iniciar o planejamento preliminar dos encontros dos próximos quatro anos, Judith foi uma das vozes americanas que levantou a questão explosiva de saber se Roma seria o único local para os encontros da CIB no futuro. “Por que não tentar noutro lugar? Porque não vir para a América?” Após o choque inicial, ficou claro que as mentes estavam se abrindo para algo anteriormente impensável.
Judith gostou do seu papel pioneiro nos anos seguintes, como moderadora assistente e depois moderadora (a partir de 2006). Foi uma grande alegria para ela poder contribuir para a formação contínua de muitas monjas e irmãs beneditinas, facilitando a experiência inesquecível de viajar para o estrangeiro para reuniões de delegados e visitar comunidades nos EUA, Nairobi, Sydney, Polónia e, mais tarde, noutros países.
Com o passar dos anos, a CIB adquiriu a sua estrutura atual, da qual Judith Ann foi uma das principais arquitetas. Desde o início, a estrutura da Comissão das Beneditinas com o Abade Primaz (ainda o nome da organização) consistia em dezanove regiões, cada uma com a sua própria representação, e um Conselho composto por um Moderador, um Assistente do Moderador e dois outros membros. O Abade Primaz era o órgão de referência final.
Numa reunião de delegados em Nairobi, em 2001, foi tomada a decisão de dar um novo nome à organização. A previsível diferença de opiniões foi surpreendentemente resolvida pela escolha do latim como língua inclusiva, e assim Communio Internationalis Benedictinarum (CIB) tornou-se o nosso nome. O estatuto dos mosteiros, congregações e federações beneditinas foi definido numa série de cláusulas do Direito Próprio da Confederação (Ius Proprium). Em 2002, o Conselho (Irmã Maire, Irmã Judith Ann, Madre Irene Dabalus e Madre Joanna Jamieson), com a ajuda canônica especializada do Abade Richard Yeo, de Downside, completou o trabalho sobre um projeto de Estatuto para a CIB, que foi aprovado no Simpósio desse ano.
Nos anos seguintes, o desenvolvimento da CIB foi objeto de um trabalho árduo e cuidadoso. Muitas irmãs de diferentes mosteiros estiveram envolvidas. Judith Ann não poupou esforços para encontrar pessoas que a ajudassem. Foi encontrada uma irmã artista americana que criou o nosso belo logotipo; foi encontrada uma tesoureira que asseguraria e geriria as finanças, incluindo um fundo de solidariedade, para garantir que nenhuma região fosse excluída da participação por falta de fundos; foi necessário reunir uma equipe de tradutores, e foi preciso manter registros dos encontros e da correspondência, e a crescente comunidade internacional exigiu a publicação de um Catálogo, cuja primeira edição foi impressa em 2000.
O mérito é de inúmeras irmãs, monjas e comunidades por tudo o que foi feito nesses anos. A criação da CIB foi verdadeiramente um projeto comunitário, conduzido não por uma única pessoa ou grupo. Mas a Irmã Judith Ann, como Moderadora Assistente, era a pessoa que tinha tudo em vista e que era totalmente fiável em fazer o que tinha de ser feito. Ela estava envolvida em tudo, colocando sua experiência, sabedoria e trabalho duro na criação da CIB. Finalmente, me lembro de Judith Ann como uma construtora de pontes.
Desde o início, em 1983, a distinção canônica entre monjas e irmãs, que se desenvolveu ao longo de várias centenas de anos de história da Igreja, tornou difícil para os membros das Comissões Femininas com o Abade Primaz (representando milhares de irmãs) chegarem a um acordo sobre expressões de identidade com as quais pudessem testemunhar com credibilidade a vida monástica das mulheres beneditinas na Igreja e na sociedade. A crença inabalável nesta identidade comum e o desejo de articulá-la e torná-la tangível na Igreja e no mundo têm sido a força motriz por trás do desenvolvimento da Communio. Mudanças nas estruturas foram necessárias e ajudaram a evolução, mas isto não poderia ter sido alcançado pacificamente sem a experiência de profunda comunicação espiritual e partilha dos valores mais preciosos das respectivas vocações que quase todas as Beneditinas que participaram de um encontro da CIB experimentaram. Judith Ann distinguiu-se pela abertura e curiosidade revigorante com que interagia com as suas companheiras beneditinas da Communio. Ela não se contentava em respeitar e tolerar aqueles cujo modo de vida era muito diferente do seu. Tinha curiosidade em saber de onde vinha a outra pessoa e procurava corajosamente conhecer os outros e compreendê-los um pouco mais. Talvez nem sempre tenha sido bem sucedida, mas a sua simplicidade e humor faziam com que os erros ocasionais fossem facilmente perdoados. A hospitalidade de Judith Ann foi um catalisador maravilhoso. Esta forma de conhecer novas pessoas, de construir constantemente pontes para reunir pessoas com opiniões diferentes, tornou-se típica das reuniões da CIB.
Uma participante escreveu depois de participar do simpósio de 2014: “Embora existam diferenças óbvias entre nós, chegamos a perceber que partilhamos uma vida comum, um carisma comum, uma visão comum”. A visão comum, baseada na fé na presença de Cristo em cada ser humano, e na presença do seu Espírito na comunidade monástica, emergiu e continua a emergir através da vida partilhada e da fé de todos os membros da nossa Família Beneditina. Mas qualquer pessoa que tenha conhecido Judith Ann, e seu amor pela herança de São Bento e Santa Escolástica, concordará que sua presença e trabalho na CIB, de 1997 a 2018, desempenhou um papel único e determinante no processo, tão comum, de dissipar mal-entendidos e promover o respeito mútuo, a base da unidade de qualquer corpo. Obrigado Judith Ann! Ajude-nos, onde hoje se encontra, a trabalhar com o seu legado, enquanto reunimos forças para enfrentar os desafios do tempo presente.
[1] CIB newsletter, Novembro de 2023.
Madre Lazare Hélène de Rodorel de Seilhac
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In memoriam
Irmãs Beneditinas de Saint-Thierry (França)
Madre Lazare Hélène de Rodorel de Seilhac
1928-2023
A Madre Lazare, ainda era professa temporária quando do nascimento do Secretariado da AIM e participou do primeiro grupo da AIM quando o Padre de Floris era presidente, e foi membro do Conselho da AIM durante muitos anos. Publicamos aqui seu necrológio, antes de publicar um artigo mais detalhado no próximo boletim.
Nossa irmã Lazare Hélène de Redorel de Seilhac entrou na Vida, na luz da festa do Cristo-Rei, dia 27 de Novembro 2023.
Nasceu no dia 10 de Agosto de 1928 em Paris, e guardou um grande amor por suas raízes familiares em Corrèze, e muitas boas lembranças de seus dois irmãos. Depois de obter uma licenciatura em letras clássicas, entrou no priorado de Vanves em Fevereiro de 1953 e fez profissão em Fevereiro de 1956, e profissão perpétua no dia 24 de Junho de 1961. Ensinou latim e foi zeladora do noviciado. Escreveu uma tese em latim cristão, que defendeu em 1967: “A utilização por São Cesário de Arles da regra de Santo Agostinho”, que foi editada em 1973.
Animou muitas sessões de patrologia e sobre a Regra de São Bento para os mosteiros da França e da Africa de língua francesa. Organizou em Jouarre sessões d patrística para formar professores nos mosteiros femininos. Participou igualmente em traduções de francês fundamental dos textos monásticos e patrísticos, em colaboração com irmã Lydie Rivière, Xaveriana.
Foi ainda para os mosteiros femininos da França que animou numerosas sessões de reflexão sobre o trabalho e o equilíbrio na vida monástica. Entretanto tornou-se prioresa delegada do Mosteiro de Vanves, enquanto uma parte da comunidade, a prioresa e o noviciado se estabeleceram em Saint Thierry, com um Capítulo comum para as duas comunidades.
Em 1974, uma vez previsto o aluguel de locais liberados pela comunidade Vanves, foi para St Thierry. Além da liturgia e da sacristia, cursos para as irmãs em formação, assumiu a direção do atelier de imprensa, aonde sempre tinha a arte de fazer colaborar as irmãs. Aliás fazia o mesmo para todas as estagiárias que passavam pelo mosteiro. Continuou seu trabalho de pesquisa e participou no Conselho da AIM, na fundação do STIM, e durante 25 anos deu cursos de patrologia no seminário de Reims.
Em 2003, com 75 anos, foi eleita prioresa de Vanves e aí continuou seu serviço até 2010, assegurando uma continuidade, no momento em que a Congregação procurava como continuar sua presença em Vanves. Depois do Capítulo Geral de 2010, várias irmãs das nossas comunidades chegaram a Vanves, e ela pôde voltar a St Thierry, passando o testemunho de prioresa à Madre Marie-Madeleine. Este último período de sua vida foi marcado por uma dificuldade para escrever, mas perseverou escrevendo a história da nossa Congregação, e partilho conosco os frutos quando do ano do Centenário. Não conseguiu terminar completamente o trabalho, mas ficou preocupada até ao fim.
Para além de todos os seus engajamento e pesquisas, deu o testemunho de ser uma irmã que nunca fugiu dos serviços na comunidade. Sabia dialogar com as novas e as anciãs, com a família e com os amigos; durante muitos anos acompanhou os oblatos da comunidade. Sempre atenta às irmãs e aos amigos em dificuldade, testemunhava pelo seu modo de ser o que ensinava; ela acreditava na vida monástica e sabia confiar nas mais novas. Praticava a abertura de coração por convicção, embora não fosse fácil para ela. Damos graças ao Senhor que nos deu esta irmã. Escreveu a propósito do anúncio da sua morte: “Por favor, não escrevam que “voltei para Deus”: isso está reservado para o Filho, e Orígenes teve aborrecimentos póstumos por ter acreditado na pré-existência…” Suas obséquias foram celebradas na sexta feira dia 1º de Dezembro , na capela do mosteiro.