A ARTE DE CONSTRUIR MOSTEIROS HOJE
Me. Charles Hélie, OSB
Um mosteiro deve oferecer aos homens aquilo que eles mais precisam hoje: silêncio e paz. Não se trata de fabricar algo religioso ou monástico, a arquitetura deve criar o Mistério.
Será preciso criar um lugar de meditação, de busca, de oração; o sentimento brota daquilo que os olhos vêm, da harmonia dos espaços, do ambiente, da circulação.
Alegria para os olhos, alegria para o coração.
O mosteiro vive do interior, é uma obra de amor, ele não fala, ele se oferece.
A construção, por isso, obedece a objetivos e regras transmitidos de geração em geração. Estes conhecimentos constituem «a Tradição».
A Tradição obedece a leis permanentes que se situam para além do tempo e do espaço. Estas leis dizem respeito a três grandes linhas.
A implantação
O mosteiro está situado em:
um país;
uma região;
uma localidade.
Às vezes o mosteiro se funde com a paisagem, em outros casos a aproximação é importante para ajudar a descobrir a Igreja e valorizá-la. A entrada contribui para o convite daquilo que é esperado ou do que é inesperado. O relevo do terreno ou a falta (ou não) de água imporão obstáculos ou criatividade...
Os limites da propriedade são precisos e fixos. O mosteiro terá um «título de propriedade», registrado em cartório, onde constam seus limites. É um recinto para os que aí vivem, que para aí virão, que permite centrar-se sobre o espiritual, sobre a presença de Deus entre nós.
O lugar é ao mesmo tempo interior e exterior. Daí a importância de proporcionar transições que façam a ligação entre a construção e o seu entorno imediato: entradas espaçosas, pórtico, claustros ou galerias, aléias sombreadas; vai-se da igreja à hospedaria, da igreja ao refeitório ou aos ateliês. Há os espaços abertos e os espaços fechados. Esses espaços podem servir de encontro entre os que vêm da hospedaria ou da meditação, para o irmão ou a irmã que vão para o Ofício. É preciso nos sentirmos à vontade nesta casa, nesta vida comum, onde se passa da liturgia ao estudo, do trabalho à meditação, do encontro à solidão.
O mosteiro é feito para aqueles que nele vivem
«Seja, porém, o mosteiro, se possível, construído de tal modo que todas as coisas necessárias, isto é, água, moinho, horta e os diversos ofícios, se exerçam dentro do mosteiro» (RB 66, 6).
A planta compreenderá, portanto, o que é necessário, o indispensável. Segundo o plano tradicional – que pode variar de acordo com o local – deverá haver três espaços, um olhando para o outro: o da igreja, o do refeitório e das celas, e o dos ateliês. O rigor das formas impede que haja coisas supérfluas.
Os ateliês, que permitem exercer diversos ofícios, têm por função facilitar o trabalho.
O refeitório é, depois da sala capitular, outro pólo da vida social; as mesas estão dispostas ao longo das paredes, e os irmãos tomam seus lugares da mesma forma como no coro. Partindo do refeitório, a cozinha e a dispensa abrem-se para o caminho da horta.
Em todas estas atividades cotidianas, nada há de profano, trabalha-se em silêncio na presença de Deus: «Que os irmãos se sirvam mutuamente, pois por esse meio se adquire maior recompensa e caridade» (RB 35, 1).
A igreja, centro e coração do mosteiro, indica a todos a presença de Deus no meio da comunidade. Os irmãos ou as irmãs aí se reúnem para viverem juntos a liturgia. São Bento, citando o salmo 118, escreve na Regra: «Louvei-vos sete vezes por dia» (Sl 118, 164; cf. RB, 16, 1).
A construção da igreja, casa de Deus, onde se passa do mundo visível ao invisível, será confiada a um artista. É ele que deverá criar um lugar, um espaço, uma beleza capazes de permanecer. Deve também encontrar o equilíbrio entre os tamanhos e as formas, as linhas e os movimentos, a harmonia da luz, da sombra e da penumbra.
Compete-lhe fazer perceber «o inaudito», ocupando-se com a acústica que dá ao canto uma grande pureza. A acústica está ligada àquilo de que se tornará um reflexo: abrandar os sons para reenviá-los, absorvê-los ou amplificá-los.
Cabe-lhe ainda prever o espaço da comunidade, o espaço dos fiéis, o espaço para os dias de festa. Aqui também se volta à questão do tamanho e da unidade do lugar.
Quando os lugares são esplêndidos, é um choque! Mas isso não depende das dimensões, da riqueza, mas sim da qualidade, da perfeição, que nos transportam a outro lugar.
O mosteiro deverá ser bem construído
A arquitetura é determinada por uma série de fatores, dentre os quais um é essencial: o clima. Sempre nos protegemos do sol da mesma maneira: ou construindo paredes grossas ou ficando na sombra. Da mesma forma, a chuva, a secura, a umidade, o frio e o calor vão determinar o procedimento, o material, a técnica. Madeira, pedra, cimento, vidro, terra encontrarão sua beleza no cuidado com a perfeição até os mínimos detalhes.
Então, pode-se aprender a arte de construir um mosteiro?
A arte de construir é dom e trabalho.
A arte de construir é tradição e criação.
A arte de construir é escolha e cruz.
A arte de construir é alegria e felicidade.
Me. Charles Hélie, OSB, é Prioresa do Mosteiro de Saint-Jean-Baptiste, em Joffreville (Madagascar).
Traduzido do francês pelas monjas do Mosteiro da Santíssima Trindade, Santa Cruz do Sul, RS.
BIBLIOGRAFIA
Michel Bouttier: Monastères, des pierres pour la prière.
Michel Bouttier: Les Cathédrales, leurs symbolique.
Zodiaque: alguns fascículos (por exemplo: Le signe de la porte).
Chroniques d'Art Sacré: alguns fascículos (por exemplo: Le Tabernacle).