P. Martin Neyt, OSB
Os monges do Ocidente evocam regularmente como seus predecessores foram pioneiros no desbravamento dos pântanos, no cultivo das terras aráveis, na canalização das águas, nas construções e na produção de gêneros de primeira necessidade, queijo, vinho, cerveja... Nos dias de hoje, a relação entre a fabricação de um produto, sua realização, expedição e comercialização tornou-se complexa e, em nossos mosteiros, surgem questionamentos quanto à maneira de ganhar a vida, tanto na Europa como em todas as partes do mundo. O que os monges produzem nessa fase da globalização? Como eles ganham a vida? O que a AIM pode fazer para orientá-los, ajudá-los, colocá-los em contato com outras experiências? A respeito de um assunto tão abrangente, muitas iniciativas e experiências estão sendo realizadas. Dom Stanislas Diouf, Prior do Mosteiro beneditino de Segeya, na Guiné, escreve o seguinte: «Preocupados com uma rápida autonomia financeira, nós não medimos esforços. A extensão dos terrenos cultivados causa admiração aos visitantes: arrozais, canteiros de tomate, pimenta, gombo, abóbora e pepino, plantações de milho e de amendoim. Em abril, três anos depois da fundação, já colhemos quarenta e três toneladas de abacaxis. Foi necessária a compra de um caminhão para o transporte da produção até Conacry. Pretendemos comprar uma máquina misturadora-trituradora de grãos para o fabrico de ração de galinhas. AIM está ajudando a fim de nos tornarmos autônomos.»
No Mosteiro trapista de Notre-Dame de Kokubu, no Benin, está em andamento um projeto de transformação de coco de dendê em óleo vegetal ou pomada; para tanto, é preciso uma máquina trituradora. Em Buaké, na Costa do Marfim, o Mosteiro beneditino local está viabilizando um novo projeto de bandejas com alvéolos onde acomodar a produção de ovos. Esses projetos recebem, em grande parte, ajuda da AIM. No Brasil, o Mosteiro de Ponta Grossa fez um pedido à AIM para a aquisição de três máquinas apropriadas para a fabricação de velas. Também este Mosteiro está em busca de sua autonomia financeira. As monjas beneditinas de Campos do Jordão estão substituindo o trabalho manual de produtos caseiros (mel, geléia, biscoitos...) por uma organização semi-industrial (construção de locais adequados para a produção e estoque, modernização da organização contábil, novas instalações elétricas). É uma nova fase que elas estão encarando. Outros exemplos poderiam ser dados.
Neste Boletim, três artigos importantes situam questões de peso no plano espiritual e humano. Irmã Gisela Happ OSB propõe uma dinâmica na estabilidade de nossas comunidades ou, mais exatamente, a estabilidade na mudança. Como lhe dizia um dos colaboradores de uma empresa moderna: «Nós sempre questionamos os valores tradicionais e desenvolvemos novas soluções em benefício de nossos clientes.» Para tanto pressupõe-se qualificação, competência, exigência, responsabilidade. Dom Anselm Grün OSB sabe do que fala! Monge, celeireiro, administrador e escritor, oferece à AIM sua experiência vivida e suas reflexões. A AIM se alegra em poder passar adiante sua mensagem densa e sua maneira de gerenciar o dinheiro. O rigor da mensagem do Abade John Kurichianil OSB interpela igualmente cada uma das comunidades. Alimentados pela Palavra de Deus e pela tradição beneditina, vão surgindo pontos essenciais: renúncia pessoal, partilha em comum, exigências de um trabalho bem feito, amor e preocupação com os pobres, honestidade e transparência.
Os exemplos partilhados ilustram, em diversos continentes, como os mosteiros concretizam seus projetos econômicos. Mais do que nunca, em um mundo onde o preço das matérias primas é assustador, as comunidades monásticas devem aprofundar a comunhão e a solidariedade humana e financeira entre elas e com as populações dos arredores. Pois, muitos problemas existentes em diversos continentes são conseqüência de um sistema econômico imoral. A formação dos celeireiros, bem como dos monges e monjas, é algo de muito necessário.
O desenvolvimento da associação «MONASTIC» é uma atividade importante e exemplar de solidariedade entre os mosteiros na França e em outros lugares. Não hesitem em partilhar conosco outros projetos do mesmo gênero e suscitá-los a fim de serem conhecidos por outros mosteiros. «MONASTIC» presta ajuda em todas as questões relacionadas às realidades econômicas a cerca de duzentos e trinta comunidades.
A palavra ajuda, até algum tempo atrás, podia significar: «Nós, os mosteiros, pedimos auxílio à AIM. E vocês nos dêem o que puderem». A articulação pedir-receber, baseada na confiança, não basta mais nos dias de hoje nem constitui uma relação justa e verdadeira. A própria AIM deve justificar o que faz com as doações que lhe são concedidas. Os organismos que permitem o desenvolvimento da AIM exigem uma contabilidade rigorosa e uma justificativa das doações feitas. Por conseguinte, é necessário substituir a relação dar-receber por uma relação de verdadeira parceria. Isso requer conhecimento mútuo, transparência das contas e, finalmente, solidariedade entre os mosteiros. Muitos mal-entendidos e a-priori ainda precisam ser superados para que se chegue a esse ponto! A substituição da «ajuda» pela «aliança» vai se fazendo pouco a pouco.
Em outro nível, o do Diálogo Inter-Religioso Monástico, a AIM apresenta, na pena do frade dominicano Thierry-Marie Courau, as diversas correntes que perpassam o monaquismo tibetano. Como não estar atento e solidário para com essas tradições que fundamentam sua existência na abertura para o Essencial e salvaguardam uma outra maneira de habitar nosso planeta?
Padre Martin Neyt, OSB, é monge do Mosteiro de Saint-André de Clerlande (Bélgica) e Presidente da AIM.
Traduzido do francês por Dom Matias Fonseca de Medeiros, OSB.