A formação inicial dos candidatos
Madre Lúcia Tartara, OCSO
1. É evidente que sendo limitada a minha experiência, não posso generalizá-la, em virtude das mudanças muito rápidas das gerações, das diferenças culturais e, sobretudo, porque não há duas pessoas iguais. Quanto mais o tempo passa, mais concordo com o que diz Santa Teresa do Menino Jesus: as almas se diferenciam mais do que os rostos, e essas diferenças são mais profundas do que as existentes entre as culturas e as gerações, principalmente nos dias atuais. Entretanto, não é impossível falar daquilo que elas têm em comum: o desejo profundo do coração humano que, em suma, é o mesmo.
2. É preciso conscientizar-se de que o fato de falar sobre os candidatos nos leva a questionar sobre nós mesmos e sobre nossa própria comunidade.
3. Toda pessoa que abandona seu gênero de vida e suas relações para entrar no mosteiro é um milagre. Mesmo se suas motivações conscientes são confusas. A vocação não vem de si mesma, mas de Deus, e é uma graça imensa. Portanto, é preciso não ter vergonha de pedir isso a Deus e a seus santos. Antes de irmos ao parlatório é preciso que o encontro seja precedido pela oração. Esse encontro não deverá ter a pretensão de monopolizar, nem o ceticismo ou o medo. A capacidade de discernir é antes de tudo a aceitação de um desafio: procurar a pérola preciosa do desejo verdadeiro da pessoa presente, desejo escondido, talvez, sob mil motivações falsas. Hoje, a pessoa que bate à porta do mosteiro, dificilmente tem as idéias claras sobre o que Deus quer para ela. Se depois compreendemos que Deus a chama para outro caminho, não teremos perdido nosso tempo: encontramos um tesouro escondido e ajudamos alguém a descobri-lo em si mesmo.
Por isso, o encontro deve ser marcado por um certo entusiasmo. A palavra «juventude» deveria indicar entusiasmo, e a idade adulta prudência, mas de uns tempos para cá, não é mais assim. Os jovens são prudentes e temerosos. O que se espera de nós nessa acolhida é o entusiasmo que brota pelo fato de sermos felizes em nossa vocação, tanto pessoal quanto comunitária.
4. Pela palavra «feliz» entramos no desafio de hoje. Geralmente, os jovens atuais não acreditam em seu desejo de felicidade. O secularismo os torna mais céticos do que supomos. A cultura niilista, mesmo se não expressa teoricamente, foi aspirada e entrou nos pulmões e no coração: «Eu vim do nada e vou para o nada. Não sou ninguém». É claro que não o dizem a si mesmos: sorriem, são amáveis, mas pode-se pressentir justamente nessa atitude, uma certa tristeza. Chamo essa tristeza «amável cinismo» ou «niilismo de veludo». O ano de 1989 foi indicado formalmente como o da queda das ideologias; foi também o ano da queda do muro de Berlim. As ideologias desapareceram e restou apenas o desprezo pelo ser humano.
Não é de se admirar, uma vez que o homocentrismo sempre levou à perda do homem no meio da natureza. Os cristãos não ficaram indenes. Por exemplo, primeiro desapareceu a escatologia («para onde vamos»), talvez por medo das fugas no futuro, e assim a esperança em muitas coisas também desapareceu, como o fato de dizer que o sofrimento terá uma recompensa eterna. Agora desaparece pouco a pouco não somente a idéia abstrata da criação, mas também o sentido de si, dos outros e das coisas enquanto «criadas»: que nós não nos fizemos a nós mesmos, que viemos de um amor que nos cria a cada momento e nos conduz pelos caminhos da história em direção ao próprio Deus.
Não é somente uma família que falta aos jovens, mas o que lhes falta é uma família que lhes dê, de maneira existencial, o sentido de terem sido criados por um Amor maior.
É sobre esta desconfiança existencial que se implantam os verdadeiros traumatismos e as violências que eles suportaram desde sempre como uma coisa normal. A pornografia, o gosto mórbido da morte, o culto do macabro e do feio: imagens normais oferecidas como algo evidente nas nossas cidades.
Pode-se ler em seus olhos, além do sorriso superficial, esse cinismo amável, essa tristeza e esse medo que podem revelar muitas vezes uma passividade resignada. O niilismo de hoje não é aquele entusiasmo do século XX, que revelava exteriormente as forças afetivas. Atualmente, as forças ativas da pessoa implodem nela, por exemplo, no uso da sexualidade, de pensamentos de vítima, de sonhos para tornar-se importante sem fazer nada para isso, numa certa negligência e preguiça... O «nada» é cômodo e leva à acédia. Mesmo o «fazer» muitas coisas para evitar «ser», ou «fazer tudo o que se pode para se mostrar capaz», são manifestações típicas da preguiça contemporânea.
Dar uma resposta moralista não é muito útil: «não faça isso». As razões são mais necessárias do que outrora. Há trinta anos, se os jovens pediam os motivos e os exigiam, achando às vezes os educadores incapazes de responder, hoje, talvez, os jovens não mais os pedem e se satisfazem com a proposição moral de uma mudança que não perturba as raízes do espírito e do coração. Entretanto, é justamente por isso que nós devemos nos empenhar em apresentar razões, em suscitar o desejo de saber as razões. Como?
Começarei por perguntar a mim mesma (e à minha comunidade): pessoalmente, que mentalidade tenho eu?
A filosofia e a teologia não estão reservadas aos peritos, mas é também a maneira de viver do comerciante de frutas e legumes. Qual é a minha filosofia? Qual a minha teologia? Será que eu desejo levar a sério aquilo que creio e o que não creio, para aprofundá-los racionalmente? Sou consciente que de outra maneira minha vida – mesmo as relações e os sentimentos – receberá está influência sem que eu o perceba?
Nos jovens, como sabemos, há muita confusão intelectual, espiritual e moral. Intelectual: por exemplo, na prática mental de hoje da justificação em relação a tudo, o princípio da não contradição não é seguro. Espiritual: uma coisa é orar, outra é falar consigo mesmo. Moral: uma coisa é o pecado, outra é o fato de se sentir em falta, ou ainda, uma coisa é a virtude, outra a hipocrisia; uma coisa é a caridade, outra é só fazer o que gosta...
A confusão requer clareza. Na formação inicial, muitas vezes temos a impressão de desmanchar uma bola de linha toda emaranhada... Para esclarecer as outras, geralmente parto de mim mesmo: minha «linha» segue a linha reta do pensamento de Cristo? Como posso sabê-lo? Há certas partes do Credo que aprecio e outras que passo por cima? Quais? Creio na vida eterna? No valor do sofrimento? Ou será para mim qualquer coisa de negativo, como o é para essa jovem que está à minha frente? Qual é minha antropologia? Sou eu também tentada a reduzir sua pessoa (ou a minha) a mecanismos psicológicos? Ou a seus defeitos? Será que creio na possibilidade da educação (realizada antes de tudo pela graça invocada na oração) dos seus sentimentos, a fim de que, tanto eu como ela, possamos mudar nossa maneira instintiva de «sentir» na de Cristo? Etc.
O estudo é importante para clarear as idéias, mas o que ensinaremos em nossos cursos só formará a mentalidade e os hábitos de vida com uma condição: aquilo que transmitimos nos cursos seja o que nós e nossas comunidades cremos realmente e que – com todas as nossas incoerências e pecados – nós desejamos realmente viver.
A esse respeito é importante não nos situarmos em posições ultrapassadas. Frequentemente nós, cristãos, diante das modas do mundo, temos a característica, com o desejo justamente de ser atuais, de estarmos sempre antiquados. Talvez porque efetivamente não somos feitos para as modas... Dou alguns exemplos: posso ter receio de uma maneira de rezar muito «devota» porque há 50 anos já era anti-litúrgico: recitava-se o terço durante a missa, ou ainda, não se escutavam as leituras da missa, esperando somente o momento sagrado da elevação. A «moda litúrgica» há 40 anos era anti-devocional, pelas mesmas razões. Isso não significa que um jovem de hoje, que deseja rezar o terço ou gosta da adoração eucarística, tenha em seu coração um falso desejo.
Não viver de ideologia significa saber acolher e valorizar os desejos positivos do coração dos candidatos e integrá-los na visão vasta e rica da vida cisterciense.
Mesmo um certo tipo de psicologismo ou de ecumenismo são ultrapassados... O pensamento medíocre, a metodologia da dúvida, são respostas ultrapassadas. E mesmo os jovens, embora não o digam, percebem isso. É um desafio para nós: conforme nossas posições (as do cristianismo e da Igreja, que são sempre jovens da juventude de Cristo, ou aquelas da moda atual, que envelhecem rapidamente) nós compreenderemos – ou não – os problemas dos jovens que vem ao mosteiro e teremos para eles uma resposta sedutora ou uma resposta velha e ultrapassada.
5. Os jovens, e todo ser humano interiormente jovem, mesmo não crendo na possibilidade de felicidade, é capaz de sentir seu «odor»... E isso os comove.
Se hoje, na Igreja, quase todos os bispos falam da «emergência educativa», penso que o mérito reverte também para os próprios jovens que de muitas maneiras podem ser educados.
Uma das vantagens da queda das ideologias é que os jovens têm menos preconceitos. É claro que talvez eles jamais tenham ouvido falar das coisas as mais evidentes da Sagrada Escritura, mas são muito disponíveis. Um jornal não católico, comentando o afluxo de jovens nos encontros com o Papa, escrevia: «As sociedades européias atravessam há muito tempo um período longo e devastador de superficialidade existencial e sentem como um estraçalhamento a ausência de projetos, de uma utopia...» É por isso que os jovens desejam encontrar no mosteiro um nível diferente daquele ao qual estão habituados no mundo. Isso parece paradoxal, mas apesar de todo o seu cinismo de veludo, eles têm necessidade de grandes ideais. A palavra «santidade», paradoxalmente, fala a esses quase pagãos mais do que a nós. Qual é, pois, a necessidade profunda do coração dos jovens hoje?
Como de costume, façamos um retrocesso: qual é a verdadeira necessidade de minha comunidade no que concerne aos candidatos? Às vezes pode acontecer que a necessidade do candidato e a da comunidade não apenas não coincidem, mas parecem entrar em conflito. É preciso então que a comunidade saiba encarar suas expectativas: sente necessidade de receber pessoas tranqüilas, bem educadas, e se escandaliza diante de alguém sem boa educação e que «viveu no pecado»? Tem necessidade de uma pessoa trabalhadora e se encontra diante de alguém que nunca trabalhou com responsabilidade? Tem necessidade de pessoas maduras e Deus lhe envia candidatos muito jovens; ou, ao contrário, necessita de forças jovens e se defronta com pessoas de certa idade? Etc.
Não se trata de «recusar quem não nos agrada», nem, pelo contrário, «receber todos os que se apresentam», mas de avançar mais profundamente, por um processo que, num encontro entre candidato e comunidade, permita evoluir tanto um como a outra. Às vezes, pode acontecer que a falsa necessidade do candidato coincida com a falsa necessidade da comunidade. Por exemplo, no caso típico para os mosteiros femininos, onde entram «pessoas generosas», que se escondem atrás do perfeccionismo ou de um infantilismo agradável para a comunidade, mas que realmente não permite um crescimento pessoal. A verdadeira necessidade da comunidade é que aquele que é enviado por Deus – se é Ele quem de fato o envia – provoque em todos uma mudança positiva, uma maior verdade, caridade, fidelidade. Como nos casamentos, o desafio educativo diz sempre respeito às duas partes.
Voltemos às necessidades dos jovens: quais são? Penso que são as mesmas de todas as épocas, as mesmas que levaram Agostinho à conversão: «Conhecer-me, conhecer-Te». Primeiramente o jovem quer ser ele mesmo: a pergunta se dirige ao seu «eu». Vi muitos jovens que, entrando no mosteiro, pensavam querer dar a sua vida ao Senhor ou pensavam desejar uma vida de oração, mas depois descobriram que as frases que formulavam durante o dia começavam quase todas pela palavra «eu».
Não que seu desejo de viver somente para o Senhor não seja verdadeiro: era realmente mais verdadeiro do que pensavam, porque o próprio Deus tinha esse desejo para eles. Simplesmente, no mosteiro eles começavam a se conhecer e a ver que, de seu lado, eles eram egocêntricos. Se eles (e seus formadores!) conseguissem ultrapassar o escândalo de tantas falsas imagens que caem (e, infelizmente, às vezes o próprio formador tem medo da realidade tanto quanto os postulantes) o «eu» que eles verão diante de si será uma coisa pequena. Somente a partir da segunda questão – «Te conhecer» – nós descobriremos sua imensa dignidade.
Conhecer-se em Deus: fazer vir à tona, por exemplo, seus falsos desejos pessoais e poder dirigir-se ao desejo profundo, bom e verdadeiro que os falsos anseios encobrem. «O próprio pecado é um apelo ao estado de inocência», dizia João Paulo II. Concretamente, por exemplo, atrás de um ciúme pode haver talvez uma carência de afeição na infância, mas não podemos nos deter nisso: pode haver aí também um desejo de poder, de egoísmo e certos pecados concretos. Num nível mais profundo, todavia, a pessoa não desejaria este pecado, mas sim ser amado e amar. Desejo que o pecado escondia, porque somente amando é que se pode reconhecer que se é amado... Este ciúme remete, pois, a qualquer coisa de grande, de belo, de possível, em Deus. O Evangelho e a Regra são o caminho para descobrir isso.
Conhecer-se, conhecer-Te: neste desejo a Igreja está compreendida, ela que é carne e sangue vivo desse Tu. Não nos podemos conhecer em Deus, sem nos conhecermos na comunidade. Conhecer-se através dos outros, conhecer os outros, aprender a amar, tornar-se um com os outros e com a comunidade, identificar-se com a Igreja de Cristo, tornar-se um com a Pessoa de Cristo, no Espírito Santo... Eis o desejo. «Nada mais?», pergunta-se Santo Agostinho. Estamos realmente seguros de que os candidatos nada mais desejam? Vencer? Obter cargos? Será que desejo algo mais? A resposta de Agostinho, bastante humana como a nossa, é: «Nada mais».
6. Então, como educar, como ajudar a fazer eclodir o desejo verdadeiro? Eu ainda não li o livro da Conferência episcopal italiana «O desafio educativo». Esse texto e tantos outros podem dar uma resposta bem superior à minha. Partilho, pois, somente, minha experiência como mestra de noviças, durante 22 anos.
A educação, na comunidade, deve ser prioridade: por experiência, sei que quando uma comunidade tem outros problemas (para nós, por exemplo, a construção do mosteiro), ela tem a tentação de deixar para um segundo plano o trabalho da formação: é um grande erro. Outro erro é o de delegar a outros a tarefa educativa: por cursos, pelo auxílio de um psicólogo, etc. Os candidatos, em geral, já foram «abandonados» por sua própria família: delegados à escola, a um psicólogo, ou a presentes de objetos, a roupas de luxo ou a diversas permissões (dependendo do nível econômico da família, mas o cerne da questão é o mesmo), de maneira a não dar amor, isto é, educação. Não corremos, às vezes, o mesmo risco, dando cargos ou permissões em lugar de formar as pessoas em crise? Delegar não é cometer um pecado de omissão, não é somente deixar de formar, mas é formar de modo errôneo para algo de falso.
Na comunidade monástica todos são chamados a amar pessoalmente e, portanto, a educar: cada um no lugar e da maneira que Deus estabeleceu para ele.
«A relação educativa é uma relação entre uma autoridade e uma liberdade» (Cardeal Cafarra). Conheço, por experiência, o risco que existe em conceber a relação educativa como relação entre duas liberdades e nada mais. «A liberdade e seu exercício não é um absoluto acima do qual não existe outra coisa... Existe uma verdade sobre o que é bom e sobre o que é mal, que precede o exercício de nossa liberdade e segundo a qual este exercício é julgado. Por que uma pessoa assume o dever e a responsabilidade de propor a outra pessoa um gênero de vida determinado? Porque ela estima que esta proposta é verdadeira» (idem).
Os candidatos têm necessidade de saber quem é a autoridade deles, se devem ser sua própria autoridade, se existe um caminho maior que o seu e alguém que o conheça ou não. Mesmo as pessoas das últimas gerações têm pouco senso de autoridade e tendem geralmente a se situar em igualdade de condições, ou, ao contrário, a se fazer de «criança» (as duas modalidades podem coexistir na mesma pessoa).
Sobre que bases a autoridade se impõe? Conforme seus dons humanos? Qual é a proposta de vida feita pela autoridade? Que proposta ela pensa ser verdadeira? E a crê verdadeira em função de que? Segundo seu julgamento subjetivo? Conforme a resposta a estas perguntas nós teremos: ou o autoritarismo, o subjetivismo e o individualismo (que são as ideologias atuais), ou uma proposta educativa verdadeira. De acordo com minha experiência, é digno de fé quem reconhece uma autoridade acima de si, é pai/mãe quem sabe se reconhecer filho/filha da Igreja.
Todo mundo reconhece, mesmo no domínio leigo, que a formação é global, assumindo a pessoa inteira, ou então ela não existe. Desde quando arruma a cama de manhã, até a descoberta da Santíssima Trindade.
Eis algumas observações nesse sentido, a partir das exigências das novas gerações, que tem a necessidade e também (se elas encontram verdadeiros educadores) o gosto de aprender (sem ordem de importância):
• Trabalhar com cuidado, responsabilidade e atenção, de maneira a que o espírito não divague e não se esvazie, experimentando em seguida a satisfação de ter utilizado a cabeça e as mãos eficazmente.
• Raciocinar, olhar e estudar a realidade (de maneira simbólica, não apenas técnica), a analisar e sintetizar. Aprender a imaginar, a utilizar a fantasia e o senso estético. Para isso são úteis o estudo da filosofia, os exercícios de lógica, o estudo da literatura e das artes, algo que nos séculos passados fazia parte dessa educação humanista que até o simples camponês trazia consigo e que não mais faz parte da civilização tecnológica e da informática. Coisas que os monges sempre transmitiram, criando uma cultura. Para aquele que trabalha na cozinha, preparar um prato pode também ser uma arte...
• Ler sua história pessoal como uma história sagrada. Há muito tempo não existe mais uma teologia da história, e os jovens (ou eu também) não tem mais o senso de sua história como uma história feita por Deus, sobretudo no referente aos acontecimentos mais dolorosos. Eles poderão ser ajudados com o estudo da história bíblica, da história monástica, da Ordem e de sua própria comunidade, de seu país, da história do mundo, da Igreja e da vida dos santos que construíram sua própria época. Entretanto, o essencial não é conhecer os fatos, mas saber ler neles o desígnio de Deus.
• Aprender o sentido dos sacramentos, por exemplo, da confissão freqüente não como uma libertação da falta, mas como experiência de recriação. Os candidatos muitas vezes não têm o sentido cristão do pecado, mas o de um moralismo ateu. Aprender a amar a Eucaristia. A necessidade da descoberta dos «mistérios da fé» pela lectio e o estudo teológico e litúrgico.
• Aprender o dom, o serviço, a gratuidade, aprender a se colocar no lugar dos outros: eles têm necessidade de que se lhes ensine, fazendo-os realizar um «exercício prático», uma vez que se aprende a amar amando. Aprender a conhecer a castidade como beleza. Aprender a verdadeira amizade.
• Aprender também a confiança, por exemplo, pela abertura do coração. Para os jovens de hoje isso não representa uma proposta que pareça ofender sua consciência. Não as encaram como uma obrigação: sentem mesmo o desejo de fazê-lo, para descobrir que para o amor de um pai ou de uma mãe não há nada de «excessivamente mau» e que o maior mal também é pouca coisa diante do amor de Deus. Se o formador não freia esse desejo, com medo de ofender a consciência do formando, ou ao contrário, para evitar sua curiosidade (mas estes são problemas do formador, não da pessoa em formação!), isso pode levar o formando à descoberta de sua própria dignidade na confiança e no amor. Conduzirá à experiência da responsabilidade, porque a verdadeira misericórdia não é «fácil», mas conduz à responsabilidade. Entre todos os pontos que acabamos de enumerar, este é talvez o mais difícil. Os candidatos «normais» não fizeram muito a experiência de se confiar a alguém. Ou, melhor ainda, a grande maioria dentre eles fez (talvez somente uma vez, mas isso lhes foi suficiente) a experiência de se abrirem e de terem se enganado. Ou então se abriram a alguém que não os levou a sério, deu-lhes um tapinha no ombro, dizendo «meu pobrezinho», e não os tornou responsáveis. Os jovens, então, não tiveram mais confiança e pensaram: «Se para eles é somente a aparência que conta, é melhor guardar para si essa ferida e dar uma boa imagem de si».
Se, há 50 anos, podia-se dizer «Senhor, mais vale a morte do que o pecado» (talvez não muito sinceramente...), agora, uma tal fórmula não viria à cabeça de ninguém. E substituída, sobretudo para as mulheres, por: «Mais vale a morte que fazer um papel medíocre». Porém, sob o desejo de fazer um «papel bonito», não há, talvez, o desejo, positivo, de ser amado e estimado por aquilo que se é realmente, isto é, por nossa grande dignidade de pecadores perdoados?
• Não encontrar na autoridade a figura de um «avô» que acolhe, justifica e não sabe corrigir e retificar. Não encontrar na autoridade um irmão como eu. Em nossa sociedade de competição, a «paridade» não existe: ou tu ganhas ou eu ganho. Não lhes oferecer uma autoridade, mas uma paridade é uma certa maneira de os obrigar, inconscientemente, a fazer, como quando estavam no mundo, a prova de força: «quem vencerá de nós dois?». Os jovens têm necessidade de alguém que saiba «ganhar sua alma», isto é, ganhar para Deus suas possibilidades afetivas, intelectuais, espirituais, pelo caminho da conversão.
• Ter com Cristo um encontro pessoal, esponsal, que não conhece os setores separados do gênero «gavetas», mas que o encontro seja tanto na oração pessoal e na lectio como na liturgia, como acontecia, por exemplo, com Santa Gertrudes. Não temer, pois, de lhes propor isso.
Isso parece uma contradição, mas o que os jovens de hoje mais desejam é que confiem nele: esta confiança proposta por Jesus aos publicanos e às prostitutas para que eles se tornem santos. A proposta é de visar algo, para a verdade, para a santidade. A confiança em suas mais altas possibilidades espirituais. «A felicidade dos jovens, como dos anciãos, é qualquer coisa que vale a pena, se estamos dispostos a pagá-la, expondo-nos perigosamente», escreveu uma jovem (não crente), saída do nada da droga: é, a meu ver, o maior paradoxo e o desafio dos candidatos para hoje.
Madre Lucia Tartara, OCSO é Superiora do Mosteiro de Nossa Senhora do Moldau (Klášter Nasí Paní nad Vltavou), mosteiro trapista feminino situado em Poličany, Distrito de Benešov, Arquidiocese de Praga (República Tcheca).
Traduzido do francês por Irmã Maria Cruz, OSB (Mosteiro Nossa Senhora da Paz, Itapecerica da Serra, SP)..